Assalto ao trem pagador é uma referência a um roubo a uma locomotiva postal ocorrido em 8 de agosto de 1963 no condado de Buckinghamshire, na Inglaterra. Na ação, um grupo de 17 pessoas (15 ladrões e dois informantes) levou a quantia de aproximadamente 2,6 milhões de libras esterlinas (2.631.784 para ser exato) de um trem que ia de Glasgow, na Escócia, para Londres, transportando depósitos bancários.[1][2][3]
Os assaltantes pertenciam a duas gangues de Londres: a South West (Sudoeste, em português) e a South East (Sudeste, em português). O roubo foi planejado por Bruce Reynolds e Ronald Biggs, que haviam se conhecido na prisão alguns anos antes.
O assalto
A ideia
Bruce Reynolds soube da existência do trem pagador em 1960, em uma conversa na prisão. Acreditava, a princípio, que um assalto à locomotiva seria impossível. Três anos depois, em Londres, foi procurado pelo seu antigo companheiro de cela, Ronald Biggs, que precisava de um empréstimo. Foi quando Reynolds o convidou para participar de um audacioso assalto. Biggs, um carpinteiro recém casado, aceitou a proposta. A data escolhida foi 8 de agosto. A dupla descobriu que bancos escoceses enviariam nesse dia uma grande remessa de dinheiro a Londres por meio da linha férrea postal.[6][7]
Os envolvidos
Bruce Reynolds foi o cérebro do assalto. Chegou a trabalhar como revendedor de antiguidades, mas dedicava mais tempo a crimes. Ronnie Biggs também já havia participado de alguns delitos. Junto com a dupla, outras pessoas estiveram envolvidos no assalto, seja antes, durante ou depois do evento. Confira a lista com alguns deles:
- Bill Boal, engenheiro;
- Bobby Welch, dono de uma boate;
- Brian Field, advogado, responsável pela compra da fazenda Leatherslade, usada como esconderijo;
- Charles Wilson, atuou como tesoureiro. Tinha a tarefa de dividir o dinheiro roubado entre os integrantes do bando;
- Gordon Goody, cabeleireiro;
- James Hussey, decorador;
- James White, ex-para-quedista;
- John Wheater, advogado, atuou em prol da quadrilha;
- Roger Cordrey, florista;
- Ronald Edwards, ex-pugilista, dono de um clube;
- Roy James, ex-piloto de corrida e ourives;
- Tommy Wisbey, apostador profissional.[8]
A execução
Os assaltantes foram avisados por um informante, pouco após a meia-noite, de que o trem postal havia partido de Glasgow. Era o gatilho para o início da operação. Eles embarcaram em dois Land Rovers e um caminhão do Exército roubado e deixaram o esconderijo – a fazenda Leatherslade, distante 40 quilômetros do local do roubo.[9]
Pouco tempo depois, os bandidos se posicionaram em pontos previamente planejados. Na região de Leighton Buzzard, o semáforo da via férrea foi alterado. A luz verde, que indica ao maquinista para seguir normalmente, foi coberta, e a lâmpada amarela, que obriga uma parada do trem no próximo semáforo, foi ligada por meio de baterias. Em Sears Crossing, a mesma tática foi utilizada, mas, dessa vez, a luz vermelha foi acionada. Eram 3h30min da madrugada quando o maquinista Jack Mills, obedecendo a sinalização, parou o trem.[10][11]
A linha de telefone de emergência do local foi cortada preventivamente pelo bando. Perto dali, em um terreno elevado, um dos assaltantes, munido de um walkie-talkie, avisou os comparsas da chegada do trem. Quando a locomotiva parou, o assistente de Mills, David Whitby, desceu da cabine para conferir o motivo da parada não programada. Foi surpreendido pela quadrilha, que o imobilizou. Os assaltantes subiram no trem e renderam Mills acertando um golpe na cabeça dele com uma barra de ferro. Em seguida, os funcionários do correio, que estavam com os malotes de dinheiro, também foram rendidos. [12][13][14]
Um integrante do bando desengatou a locomotiva e os três vagões seguintes do restante do comboio. Na sequência, um condutor aposentado, recrutado especialmente para substituir o maquinista original, não conseguiu dominar os controles do trem. Por fim, Jack Mills, mesmo sangrando, foi obrigado a levar o trem até a Bridego Bridge, onde a outra parte do grupo de assaltantes aguardava nos veículos. Foram desembarcados 120 sacos de dinheiro. A turma fez uma espécie de corrente humana para agilizar o procedimento. A carga valiosa, então, é levada de volta ao esconderijo.[15][16][17]
Mancadas e fuga
Na fazenda, o grupo, enfim, relaxou. Beberam, jogaram cartas e até mesmo Banco Imobiliário. Alertados da aproximação da polícia, a quadrilha teve que abandonar às pressas o local. Um comparsa foi pago para apagar todos os rastros deixados pelo grupo. Porém, ele resolveu pegar o dinheiro e fugir sem fazer a tarefa. Até hoje, o paradeiro do ladrão traidor é desconhecido.[18]
O esconderijo foi descoberto pela polícia devido à denúncia de um fazendeiro local. Ele percebeu a presença do caminhão do Exército dias antes. Quando soube do assalto, avisou as autoridades imediatamente. Ao investigar a casa, a Scotland Yard encontrou muitas impressões digitais, até mesmo nas peças do Banco Imobiliário deixado para trás. Com os rastros, foi possível localizar os participantes do assalto.[19]
Outra pista ajudou as autoridades policiais a descobrirem quem era o chefe da quadrilha. Bruce Reynolds chamou um conhecido para agir como falso comprador da fazenda Leatherslade. O problema é que o amigo usou o seu verdadeiro nome na transação, além de contratar um escritório de advocacia para intermediar as negociações.[20]
Desfecho
Três semanas depois, 11 dos 17 integrantes da quadrilha já estavam presos. A maioria foi condenada a 30 anos de detenção.[21][22]
Alguns conseguiram fugir da prisão. Um deles foi Ronald Biggs. Ele ficou quase dois anos encarcerado, mas, em 8 de julho de 1965, após subornar funcionários da penitenciária de Wandsworth, escapou, escalando o muro com uma escada de corda comprada por comparsas. Fugiu primeiro para Paris, na França, e depois para a Austrália. Após três anos, com receio de ser reconhecido, partiu para o Brasil, em 1970, indo residir no Rio de Janeiro. Chegou a viver mais de 30 anos no Brasil. Em maio de 2001, Biggs decidiu se entregar às autoridades britânicas. Lá, foi para a prisão de Belmarsh, em Londres. Morreu em 2013 aos 84 anos.[23][24][25][26]
Bruce Reynolds conseguiu escapar da polícia. Durante cinco anos, viveu escondido no México e Canadá. Com o fim do dinheiro, voltou à Inglaterra, onde foi preso. Cumpriu pena por dez anos. Solto em 1978, chegou a trabalhar como consultor no filme Buster, que conta a história do famoso assalto. Foi preso novamente por mais três anos acusado de tráfico de anfetaminas. Morreu em 2013, aos 81 anos.[27]
Jack Mills, o condutor do trem pagador, nunca se recuperou totalmente do golpe com uma barra de ferro que levou na cabeça. Morreu de leucemia sete anos depois do assalto.[28]
O assalto ao trem pagador chegou a ser conhecido como "o crime do século" na Inglaterra. Segundo pesquisadores, o roubo já rendeu 27 livros, 17 documentários e quatro filmes de longa-metragem
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