O TEDH e a censura judicial
As condenações de Portugal, por violação da liberdade de expressão, pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos já quase deixaram de ser notícia. E, no entanto, nunca é de mais lembrar a importância de liberdade de expressão não só para podermos dizer o que entendemos dever dizer, mas também para podermos ter acesso à informação, numa sociedade em que a informação é uma mercadoria de enorme valor. O caso já se passou em 2011 e só agora o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos se veio a pronunciar sobre o mesmo: Óscar Queirós, jornalista do Jornal de Notícias, noticiou, em 25 de Outubro, que um professor em Alijó tinha sido acusado pelo Ministério Público (MP) de Alijó por cinco crimes de abuso sexual de criança e um de maus tratos. E nessa notícia relatava os casos que constavam da acusação do MP, a que tinha tido acesso, uma vez que o processo já não estava em segredo de justiça, bem como o facto de o professor negar todas acusações e continuar a leccionar. O professor recorreu aos tribunais acusando o jornalista da prática do crime de difamação e pedindo-lhe, e ao jornal, uma indemnização. O Tribunal de Mirandela considerou que o jornalista não tinha mencionado no artigo que, posteriormente à acusação, tinha havido uma decisão (pronúncia) do juiz de instrução a remeter o processo para julgamento que só referia quatro crimes de abuso sexual de crianças e não cinco e um de maus tratos, como constavam da acusação. Além disso, o tribunal considerou que o tom do artigo afectava a presunção de inocência do professor e permitia que este fosse identiÆcado através da utilização do seu nome próprio e da inicial do seu apelido. Para o tribunal, o artigo teve como consequência a suspensão laboral do professor e a consequente perda de rendimentos. Além disso, enquanto decorria o processo penal, tinham sido difundidos rumores difamatórios que tinham manchado a sua dignidade e reputação proÆssional. Face à inconsistência factual do artigo — baseava-se na acusação e não na pronúncia, que era menos gravosa —, o Tribunal de Mirandela considerou que o interesse público da notícia não compensava o que considerou ser a falta de objectividade e rigor da mesma. E o jornalista foi condenado numa pena suspensa de 15 meses de prisão (!) e no pagamento de uma indemnização, conjuntamente com a Global Notícias, de 43.000 euros (!). O jornalista recorreu para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, em 2019, confirmou a condenação, embora reduzindo o valor da indemnização para 21.900 euros. Apresentou, então o jornalista, uma queixa no TEDH por violação da sua liberdade de expressão que foi decidida na passada terça-feira. O TEDH apontou o interesse público da notícia — até porque o professor continuava a leccionar — e sublinhou que a mesma tinha um carácter informativo e se baseava na acusação que o Ministério Público tinha deduzido e que constava do processo no Tribunal de Alijó, acessível ao público e que o jornalista tinha consultado previamente. Os tribunais portugueses tinham considerado que o artigo apresentava incoerências factuais, uma vez que não se baseava nos últimos desenvolvimentos processuais. Mas, para o TEDH, embora fosse verdade que o artigo não se referia a esses últimos desenvolvimentos processuais, relatava as acusações tal como constavam da acusação. O TEDH, embora reconhecendo que o artigo, com alegações de envolvimento em crimes de natureza sexual, era susceptível de causar prejuízos ao professor em causa, considerou que não podia estabelecer que os prejuízos tinham sido devidos à publicação do artigo, já que o processo penal existia por si e estava, na altura, pendente contra o professor. Considerou, assim, o TEDH que os tribunais nacionais não tinham ponderado devidamente os interesses em jogo de acordo com os critérios estabelecidos na sua jurisprudência, e que a ingerência estatal na liberdade de expressão do jornalista, no seu direito de transmitir informações, não correspondia a uma necessidade social premente e, por conseguinte, não era “necessária numa sociedade democrática”, sendo susceptível de desencorajar os meios de comunicação social de discutirem assuntos de interesse público legítimo, com um “efeito inibidor” sobre a liberdade de expressão e de imprensa. E, Portugal, foi mais uma vez condenado, mas desta vez não temos de pagar nada: o jornalista não fez prova de ter pago a indemnização ao professor... P.S. Para quem gosta da nossa história criminal recente, aconselho a leitura do recém-publicado livro Insubmisso — Memórias de Um Polícia, de Eduardo Dâmaso e Teófilo Santiago. Face Oculta, Apito Dourado, Aveiro Connection... tem muito para se entreter!
O pravda insiste em dar protagonismo a essa triste figura... mas ninguém lhe " passa cartão "
ResponderEliminarA ver se lhe arranjam uns trabalhinhos. Como anda à gosma......
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