quinta-feira, 9 de setembro de 2021

A Juizada fascista apoia o patronato na expulsão de Joana . Era dirigente sindical ( o caso aconteceu em Lisboa)

 

Francisco Teixeira da Mota
O silêncio das sindicalistas
«A Joana era trabalhadora na empresa Gota Amarga desde 1995 e dirigente sindical do CESP — Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal. Em Julho de 2020, em três momentos distintos (17/06/2020, 18/06/2020 e 20/06/2020) e perante órgãos de comunicação social diferentes, a Joana afirmou que 50% das lojas da Gota Amarga de Lisboa tinham trabalhadores infectados ou de quarentena. Em tribunal provou-se que existiam 40 lojas Gota Amarga em Lisboa, 17 das quais tinham trabalhadores infectados. Em 14 delas existia apenas um infectado. A Joana relatou, ainda, que tinham sido feitos exames apenas numa loja, existindo 17 contaminados e que não se faziam testes. Em julgamento provou-se que na referida loja havia 11 trabalhadores positivos. A loja ficou em quarentena. Joana declarou também que os trabalhadores tinham tido de assinar um documento em como não contavam a situação. Em julgamento provou-se que nenhum responsável tinha dado a assinar qualquer documento desse tipo. Porém, um outro dirigente sindical relatou essa situação, tendo o próprio sindicato emitido um comunicado que disso dava conta. Para além disto, provou-se que nas 17 lojas com infectados, tanto os trabalhadores, como os contactos, não ficavam a trabalhar. Se o SNS confirmava a suspeita, os trabalhadores iam para área de isolamento, sendo retirados da loja os que os tinham contactado directamente e colocados em quarentena. A Joana acusou, ainda, publicamente a Gota Amarga da falta de testagem e de não colocação dos trabalhadores em isolamento. Em julgamento provou-se que as suas declarações eram resultado de decisão do sindicato com base nas informações que tinha recolhido, sendo certo que tinha havido testagem e cumprimento das normas do SNS. Provou-se, ainda, que as declarações prestadas pela Joana tinham sido antecedidas de um comunicado emitido pelo CESP sobre a pandemia covid-19, no qual era referido que tinham tido conhecimento que em diversas lojas da Gota Amarga em Lisboa se estava a verificar um grande aumento do número de trabalhadores infectados. Joana foi despedida pela Gota Amarga, alegando justa causa por a trabalhadora ter proferido publicamente afirmações que eram falsas e punham em causa o bom nome da entidade patronal. Joana dirigiu-se ao tribunal pedindo que o seu despedimento fosse considerado ilícito e, em consequência, a Gota Amarga condenada a reintegrá-la e a pagar-lhe todos os vencimentos que tinha deixado de receber. Mas não teve sorte — nem no tribunal da primeira instância nem no Tribunal da Relação de Lisboa lhe deram razão; neste, os juízes desembargadores António José Alves Duarte e Maria José Costa Pinto, no passado dia 30 de Junho, embora afirmando aceitar que “a liberdade de expressão e o direito de crítica terão uma latitude maior quando está em causa um representante eleito dos trabalhadores, em ordem a permitir o exercício das correspondentes funções, admitindo eventuais exageros”, acrescentaram que “tal não legitimava a trabalhadora a propalar factos falsos — não meras opiniões ou reivindicações — através de meios de comunicação social” e, assim, confirmaram a licitude do despedimento da Joana. Houve, no entanto, um louvável voto de vencida, da juíza desembargadora Manuela Bento Fialho, que, entendendo que o despedimento tinha sido ilícito, escreveu: “Podemos concluir que nem todas as declarações proferidas corresponderam à verdade. Mas andaram lá muito perto, pois efetivamente o número de lojas com contaminados era de cerca de 50%. E, sobretudo, resultaram de dados disponibilizados pelo próprio sindicato. Não foram uma invenção” da Joana e, tendo esta actuado “em sintonia com as informações de que dispunha o sindicato, e sendo sua representante, parece-me que cumpria o papel que cabe às estruturas sindicais — denunciar, alertar, exigir. Ainda que exagerando. Algo próprio da luta sindical”. Não se justificava, assim, que fosse punida com o despedimento, “porquanto, neste caminho, dificilmente alguém quererá assumir as funções que a mesma exerceu”. Acrescento eu: a Joana foi, sem margem para dúvidas, punida por ter sido dirigente sindical. »

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