Quero juntar-me ao, infelizmente, pequeno coro de revoltados pelo assassinato da
jornalista palestiniana Shireen Abu Akleh.
Quero indignar-me, unido aos poucos
que me acompanham nessa revolta, com
a carga policial sobre o cortejo fúnebre da
também cidadã norte-americana Shireen Abu Akleh.
Quero aplaudir, com os raros que não
discriminam as vítimas mortais conforme a nacionalidade e a política dos agressores, as pessoas que seguraram o caixão
de Shireen Abu Akleh e, enquanto recebiam bastonadas, tentaram tudo para o
segurar, tenazes, da queda no chão.
Quero apontar, com alguns bravos nadadores contra a corrente bem comportada, o dedo acusador ao francoatirador,
anónimo, do Exército de Israel que apontou à repórter, visível ao longe no seu ostensivo colete “Press”.
Esse soldado decidiu disparar uma bala
de 5,56 mm. Fê-la sair, supersónica, a girar sobre si mesma para furar melhor, de
uma espingarda M-16 com mira telescópica. Um centésimo de segundo depois o
projétil, letal, esburacava o pequeno espaço entre o capacete e a gola do colete à
prova de bala de Shireen Abu Akleh.
Quero denunciar, com a rara companhia que encontrar, o Estado de Israel por
transformar a luta pelo seu legítimo direito à existência num processo ilegal de expansão territorial, de desumana opressão
sobre uma população, de exercício de terror sistemático sobre civis pobres, como
relatava frequentemente, para a televisão
Al Jazeera, a jornalista Shireen Abu Akleh Quero recordar, com alguns que têm
memória, que Israel recusa, há anos, ser
investigada sobre crimes de guerra, nega
a entrada no país de representantes de tribunais internacionais, rejeita receber o
relator especial das Nações Unidas para
os Direitos Humanos.
Quero referir, para os originais que se
interessam por isto, que pelo menos 144
jornalistas palestinianos foram feridos
por tropas de Israel desde 2018 e três deles
acabaram por morrer. Um desses feridos
foi Ali al-Samoudi, o produtor de Shireen
Abu Akleh.
Quero sublinhar, para resistentes a
branqueamentos seletivos, que os bombardeamentos aéreos sucessivos e massivos levados a cabo por Israel sobre a Faixa
de Gaza, em áreas densamente povoadas,
vitimam sobretudo civis inocentes, às
centenas: por exemplo, há uns tempos
uma operação dessas, que durou 51 dias,
matou 2250 palestinianos, incluindo 551
crianças. Este tipo de crimes era reportado por Shireen Abu Akleh.
Quero destacar, para a aritmética da
realidade que quase todos preferem ignorar, o facto de a resposta militar palestiniana à invasão israelita não contar com
unidades mecanizadas, Força Aérea, Marinha, mísseis, nem artilharia pesada.
Israel, por seu lado, é a 15ª potência militar do mundo e garantiu, para os próximos 10 anos, mais 38 mil milhões de dólares em armamento graças a uma ajuda
dos Estados Unidos da América. Esta desproporção de forças era mostrada nas reportagens de Shireen Abu Akleh.
Quero notificar, para o deserto dos que
se importam com a dualidade de critérios
que manda neste mundo, o quanto é diferente a atual paixão solidária para com o
povo ucraniano, vítima cruel da invasão
russa e da política de expansão da NATO,
da angustiante serenidade quase indiferente com que se assiste à sucessão de,
não vejo outro termo, crimes de guerra
cometidos por Israel, nem à aparente lenta operação de expulsão total dos palestinianos do restinho de país que lhes deixaram na Faixa de Gaza.
Posso querer isso tudo mas, inconformado, vaticino: Shireen Abu Akleh será
rapidamente esquecida.
Não é a única.- Pedro Tadeu jornalista
Coelho safaste-te. Se não fosse andares a limpar excrementos na SPAD.... estarias a cobrir como enviado especial do Kremlin ou do Garajau.
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