Até o marico José Luís Goucha queria receber 10 mil € de indemnização do crítico de televisão Cintra Torres.
Desta vez, Portugal não foi condenado a pagar estas indemnizações pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. O Governo português evitou as, muito prováveis e desprestigiantes, condenações e ofereceu-se para pagar os referidos valores para acabar com o processo que corria no TEDH.
«O crítico de televisão Eduardo
Cintra Torres e o embaixador
Francisco Seixas da Costa vão
receber do Estado Português,
respectivamente, as quantias
de 18.700 e 20.450 euros,
graças ao facto de alguns dos nossos juízes
continuarem a recusar-se a aplicar
(ou a entender) o artigo 10.º da Convenção
Europeia dos Direitos Humanos (CEDH).
Um artigo que consagra a liberdade de
expressão, e uma convenção de que
fazemos parte desde 1978.
Mas, desta vez, Portugal não foi
condenado a pagar estas indemnizações
pelo Tribunal Europeu dos Direitos
Humanos (TEDH). O Governo português
evitou as, muito prováveis e
desprestigiantes, condenações e
ofereceu-se para pagar os referidos valores
para acabar com o processo que corria no
TEDH. No caso de Cintra Torres, Portugal
foi mais longe: para além do pagamento,
emitiu uma declaração unilateral em que
reconhece a violação do direito à liberdade
de expressão de Cintra Torres e admite que
as decisões proferidas pelos tribunais
nacionais não respeitaram as exigências da
jurisprudência do TEDH. Em particular, ao
condenarem o crítico de televisão no pagamento de 10.000 mil euros a favor de
Manuel Luís Goucha, a título de
indemnização por danos à sua honra, os
tribunais nacionais não procederam a uma
ponderação justa entre, por um lado, o
direito de Cintra Torres à liberdade de
expressão e, por outro, a protecção da
reputação do apresentador de televisão.
O que tinha feito Cintra Torres para
merecer, segundo os tribunais portugueses,
pagar 10.000 euros a Manuel Luís Goucha?
Tinha publicado no dia 26/01/2018, no
Correio da Manhã, um texto com o título
“Ó Cunhado, ‘Quantos Queres’?
Os passatempos da TV sempre serviram
para dar prémios a amigos. Décadas atrás
eram mais modestos que os dez mil euros
ao cunhado de Goucha”, escrevendo a
seguir: “Manuel Luís Goucha atribuiu um
prémio de 10 mil euros a um seu cunhado
ou amigo, irmão do companheiro. Fingiu
não o conhecer quando com ele falou pelo
telefone. O nome do passatempo de
Você na TV não poderia ser mais adequado:
‘Quantos Queres.’ Dar os prémios dos
passatempos a amigos e familiares foi uma
fraude muito habitual na RTP durante
décadas. Pelos vistos, a coisa pegou e
também se utiliza na TVI. Depois deste
caso, qual a credibilidade que sobra a
Goucha e aos passatempos da TVI?”
Como o TEDH não se chegou a
pronunciar, não sabemos o que iria dizer,
mas seguramente que diria que a liberdade
de expressão não serve só para fazer elogios
mas também para um reconhecido crítico
de televisão poder fazer uma crítica
contundente e sarcástica a um estranho
evento televisivo: um cunhado de um
popular apresentador de um programa receber, num concurso desse programa, um
signiÆcativo prémio. Não deveria sequer ter
concorrido, como é evidente.
O caso do embaixador Seixas da Costa é
igualmente pedagógico: no dia 30/03/2019,
num jogo entre o Sp. Braga e o FC Porto,
Sérgio Conceição, treinador do FC Porto,
farto de estar a ser insultado pelos adeptos
do clube minhoto, levantou-se em direcção
aos mesmos e proferiu a seguinte
expressão: “Vou-te foder, Ælhos da puta
[sic].” No dia seguinte, Seixas da Costa publicou no então Twitter: “Sérgio
Conceição não parece ser um mau
treinador! Mas é — sejamos claro — um
javardo. Não vale a pena estar com
eufemismos. E os adeptos do FCP que se
revêem no seu estilo são isso mesmo — uns
javardos. Como o são os adeptos do (meu)
Sporting que gostam do Bruno de
Carvalho.”
O treinador queixou-se e os tribunais
nacionais condenaram Seixas da Costa,
como autor de um crime de difamação, na
pena de 110 dias de multa a 20 euros por dia
e a pagar 6000 euros de indemnização a
Sérgio Conceição. O embaixador queixou-se
ao TEDH da violação da sua liberdade de
expressão e o Governo português,
antecipando a condenação, propôs o
pagamento dos 20.450 euros para o
processo ser arquivado, e Seixas da Costa
aceitou, pelo que o TEDH também já não
teve de se pronunciar sobre o assunto.
Bem fez o Governo português, já que o
TEDH, certamente, iria condenar o nosso
país pela violação do direito à liberdade de
expressão de Seixas da Costa, sendo por
demais evidente que alguém que usa
publicamente as expressões que o treinador
utilizou tem de aceitar que haja quem ache
(e o diga) que ele é um javardo. Os tribunais
não devem promover o medo de falar e a
hipocrisia social.
P.S. Rui Cardoso, director do DCIAP, falou
bem no programa Grande Entrevista da RTP,
embora, ainda, com demasiado juridiquês.
Seria bom que, sem prejuízo do dever de
reserva, houvesse mais informação do lado
do Ministério Público.» (Francisco Teixeira da Mota)


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