Israel e Palestina, outra crónica difícil
Carmo AfonsoExistirão muitos motivos para os portugueses sentirem mais afinidade e empatia pelo povo de Israel. É uma democracia ocidental e parece partilhar os nossos valores, como o reconhecimento dos direitos LGBT ou os direitos das mulheres. E claro que nada disto pode ser dito sobre a Palestina. Só que nada disto tem a mínima importância perante o único facto que aqui deveria importar: no que opõe Israel à Palestina, é a Palestina que tem razão. Não há volta a dar. Israel ocupou o território da Palestina. O povo palestiniano foi subjugado, está a ser massacrado e vive em condições miseráveis. Já nos habituámos; este conflito tem sido a banda sonora das nossas vidas. Vimos mulheres palestinianas enlutadas a chorar sobre escombros de casas bombardeadas ou sobre cadáveres ensanguentados desde que existe televisão. E por vezes vimos também a retaliação dos palestinianos através das ações dos movimentos radicais de libertação, como o Hamas. Foi o que aconteceu no sábado: uma demonstração de força e de organização do Hamas. Foi também uma demonstração de crueldade. Morreram centenas de pessoas. Claro que devemos condenar e lamentar estes ataques e as mortes e feridos que provocaram. Isso é inequívoco. As vozes que costumam ficar em silêncio perante as atuações brutais das forças militares israelitas contra palestinianos — situações que se repetem diariamente e que este ano foram particularmente mortais — são as que mais veementemente condenaram os ataques do Hamas e as que manifestaram maior comoção com a brutalidade exercida sobre civis israelitas. Este contraste, entre a insensibilidade ao sofrimento palestiniano e a comoção com o sofrimento israelita, é visível e é notório. E ele é extensível a quem nos governa. O ministro dos Negócios Estrangeiros solidarizou-se com Israel e condenou os ataques, que considerou terroristas. Fê-lo em linha com as declarações de Ursula von der Leyen e de Joe Biden. Notem que houve um denominador comum em todas estas declarações: a ideia expressa de que Israel tem direito a defender-se. Isto significa que estamos a concordar com o que está para vir: mais ofensivas e ataques da parte de Israel. Mas onde estava João Cravinho quando vimos Israel oprimir, destruir e levar a cabo uma limpeza étnica de palestinos? Silêncio. Esteve em silêncio. É por isso que a declaração de João Cravinho não representa todos os portugueses. Ela não representa os que notaram e sentiram o silêncio ensurdecedor deste Governo quando foi derramado sangue palestiniano. Portugal segue à risca as diretrizes da UE e abdica de ter uma voz própria. Nunca saberemos se essa voz iria no mesmo sentido das sucessivas condenações de Israel pela ONU (a maioria delas votada favoravelmente por nós) ou se aquilo que foi verbalizado por João Cravinho — condenar apenas a violência exercida por um dos lados — esgota a posição deste Governo em relação ao conÇito. Na verdade, as resoluções da ONU são perfeitamente estéreis. Ninguém delas tira consequências. A começar por Portugal. Não existe qualquer coerência entre as posições que assumimos na ONU e as posições que verbalizamos na política externa. Como na canção do popular cantor português: somos uma lady nas declarações de apoio ao Estado de Israel e uma louca na Assembleia Geral da ONU. Há exceções, mas a maioria das pessoas que apoiam Israel neste conflito apoiam também a Ucrânia. Quando digo apoiam a Ucrânia, não me refiro apenas a condenarem a invasão. Nada disso. Apoiam a guerra e são contra esforços diplomáticos de paz porque rejeitam que se possa negociar com um invasor, neste caso com Putin. O próprio Zelensky comparou a situação da Ucrânia à de Israel, tendo afirmado que são dois países na mesma situação. O delírio aqui contido é mais do que muito. Ironicamente, Israel não aplicou sanções à Rússia e nunca enviou armamento para a Ucrânia. É assim: Portugal, tal como a UE, os Estados Unidos e a NATO, apoia a Ucrânia e apoia Israel e faz de conta que isso não é contraditório. Também a Ucrânia apoia Israel e faz de conta que Israel não é um invasor. Já Israel faz de conta que apoia a Ucrânia, mas não apoia coisa nenhuma porque quer proteger os seus interesses na Síria e ficar bem com a Rússia. A Rússia faz de conta que se opõe à lógica dos EUA de ingerência em conflitos que não lhe dizem respeito, mas interfere em todos os que consegue. Neste também. Andam todos, de alguma maneira, a brincar ao faz de conta. Mas reparem que a Palestina não. Não existe faz de conta no sofrimento, nem na chacina que se avizinha.
Mesquita destruída por um ataque aéreo israelense em Khan Younis, Faixa de Gaza, em 8 de outubro de 2023 — Foto: Yousef Masoud/AP
Parentes carregam os corpos de crianças da família Abu Quta que foram mortas em ataques israelenses na cidade palestina de Rafah, no sul da Faixa de Gaza, em 8 de outubro de 2023 — Foto: Said Khatib/AFPPalestinos inspecionam os escombros de um edifício após ter sido atingido por um ataque aéreo israelense, na cidade de Gaza, em 8 de outubro de 2023 — Foto: Fatima Shbair/AP
Porquê o gilinho não mandou o trafulha rafael macedo como enviado especial à faixa de Gaza?
ResponderEliminarE ele tem cá postura, tamanho, coragem, atitude, para alguma coisa?
EliminarSabe ganir, o criminoso.
EliminarE era pô-lo a ganir, até morrer pelas mãos dos Hamas que ele tanto idolatra.
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