domingo, 29 de junho de 2025

Para os saudosistas que dizem que no tempo do Salazar é que era bom ! Aqui vai esta grande reportagem do Jornal PÚBLICO

 

A foto acima, é o cronista e político Nuno Brederode dos Santos (1944-2017), que fez parte do grupo de militares da Comissão de Verdade em Nampula;

 Os torcionários da PIDE que cometeram estes crimes e atrocidades nunca foram julgados nem condenados por estes crimes contra civis moçambicanos.
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“Furaram-me o pescoço e queimaram-me as costas”

  O agricultor Marcos Postal Mucussete tinha 29 anos em Junho de 1966, mês em que foi detido em Muecate e transferido para Nampula, onde queriam que ele assinasse uma confissão que o associava aos “terroristas e à Frelimo”. Mucussete negou. Então os pides despiram-no e fizeram entrar o cão na sala de interrogatórios — o animal mordeu-lhe o peito do lado esquerdo e ele teve de “lamber do chão o sangue que tinha jorrado da ferida”. Numa das paredes desta divisão estava suspensa uma chapa de ferro que era aquecida e na qual os agentes encostavam a cabeça dos reclusos, provocando-lhes graves queimaduras. Mantido no mesmo lugar, Mucussete foi sovado com um “kuekuero” (bastão) e ao fim de algumas horas de maus tratos, atirado para uma cela sobrelotada, onde os presos dormiam sobrepostos uns nos outros e sobre a retrete, que era um buraco aberto no chão de cimento. Durante o dia mantinham-se em pé, por vezes de cócoras, com os membros inferiores inchados e doloridos. Havia noites em que o guarda prisional Bento Maria entrava nas celas e começava a esbofetear os que estavam mais próximos da entrada, atiçando o cão; noutras, entravam Ramos e o agente Madureira para seviciar os presos “com o cabo de uma vassoura”. Francisco Coquela, auxiliar da PIDE desde 1973, disse aos militares ter visto Ramos e Bento Maria a “açularem um cão contra um prisioneiro que gritava cheio de dores e sangrando, enquanto os guardas riam”. A Tomás Henriques Mecuaila, um capataz preso em 1964, bateram-lhe primeiro com “borrachas de pneu, réguas de ferro e varas” e depois usaram ferros aguçados: “Furaram-me o pescoço e queimaram-me as costas” em interrogatórios que se prolongaram intermitentemente por cinco meses, disse. Tomás dormia sobre o cimento, sem esteira, numa cela com mais 50 homens. Um deles era Jaime Farahane, um monitor escolar ouvido como testemunha, mas também ele uma vítima: a água era tão escassa e insuficiente que em algumas celas os homens “bebiam a água usada para a retrete”, recordou. “[Nos interrogatórios] picavam-nos o corpo com canivetes e queimavam-nos com cigarros. Coitado daquele que tivesse bigode, era queimado ou puxado até sangrar.” As torturas não terminavam sequer no momento das trasladações para outras cadeias — muitos antigos prisioneiros recordaram que nas viagens de barco de Nacala para Lourenço Marques, concretamente para a prisão da Machava, eram lançados para o porão a uma altura de mais de 10 metros. Muitos ficavam feridos e fracturavam membros, como Jaime, que partiu o braço, prosseguindo viagem sem assistência médica. Aqueles que morriam devido ao impacto da queda eram lançados ao mar. Em Nampula e noutras prisões administradas pela PIDE, como a Machava ou a fortaleza do Ibo, a grande maioria dos reclusos estava presa sem culpa formada e nunca foi levada a julgamento. Mantinham-se detidos por “medidas administrativas de segurança” ou “de internamento” — um expediente previsto na lei e ao qual a PIDE recorria com frequência para poder contornar os prazos legais da prisão preventiva. Esta era de três meses, podendo ser prorrogada por mais dois períodos sucessivos de 45 dias cada um, com prévia autorização do ministro do Interior. No acervo da comissão descoberto na Torre do Tombo encontram-se pedidos de prorrogação de preventiva datados de 1964 e 1965 relativas a pessoas que ainda estavam presas em 1973. Sob preventiva ou sujeito a “medidas administrativas de segurança”, um número indeterminado de cidadãos permaneceu nas cadeias durante anos, alguns quase dez. Em Junho de 1974, um agente de 1.ª classe, José Duarte da Cruz, preso na Operação Zebra, admitiu que em Nampula raramente era aberto um “processo judicial” e que todos os presos eram “condenados sempre em medidas administrativas”. No mesmo mês, João Baptista Ravia, um nativo que morava no Bairro Namicopo e que fora detido cerca de três meses antes, a 19 de Março, contou à comissão que depois de ser espancado perguntou a um agente se ia continuar preso mesmo não tendo feito “mal nenhum”: “Ele respondeu que como [eu] era preto podia ficar preso o tempo que o Governo quisesse.” 

Cadáveres embrulhados em mantas e inumados sem registo

 Em finais dos anos 1960 “morria muita gente” nos calabouços da PIDE, admitiram as mais de três dezenas de elementos da PSP inquiridos pela comissão. Muitas vezes, seis pessoas em apenas um dia. As mortes eram comunicadas à direcção em Maputo, através de ofícios breves nos quais se identificava o morto, a data e o local de óbito (“nesta subdelegação”, “nas prisões privativas da PSP” ou no hospital da cidade). Cópias destes documentos foram agregadas aos processos-crime. Em muitas, lê-se a manuscrito: “Decl. Bento Maria. Dr. Cruchinho”, isto é, a declaração de óbito tinha sido feita pelo guarda prisional e pelo médico que colaborava habitualmente com a PIDE, quase sempre nas celas. Era ainda o guarda quem requeria a certidão de óbito à Conservatória dos Registos de Nampula, informando a mesma da causa de morte: “Insuficiência cardíaca” ou “broncopneumonia” ou “nefrite aguda” ou “poliavitaminose”. Segundo testemunhas, os cadáveres podiam ficar horas ou dias até serem retirados das celas. Paulino Paconeto contou que na sua cela chegaram a estar cinco corpos que aguardaram três dias para serem retirados. “O cheiro que exalava era nauseabundo tornando o ar irrespirável.” 

 Na PSP, o agricultor Mucueta Mucumpua Alucasse viu morrer sete presos num só dia: “Os cadáveres eram removidos às 15 horas de cada dia, pelo que muitos cheiravam bastante mal quando os retiravam.” Nem todos os mortos eram inumados no cemitério. Interrogado pela comissão, Joaquim Alves do Nascimento, auxiliar e intérprete da PIDE desde 1962, disse que nas cadeias “morreu muita gente quer por doença quer por maus tratos quer ainda pela má alimentação que lhes era dada e que depois era levada no jipe da PIDE para local que se desconhece”. “Esse transporte”, continuou, “era efectuado pelos guardas prisionais Ramos, Bento Maria, Graça e Madureira.” Baptista Ramos, ouvido pelos militares, negou as inumações fora dos cemitérios, mas reconheceu que os cadáveres ficavam “24 horas dentro das celas” e que depois eram “embrulhados em mantas e transportados no jipe para o cemitério”. A comissão decidiu então ouvir o coveiro. Abílio Roda depôs a 11 de Junho perante Nuno Brederode dos Santos e Manuel Ferreira da Cruz: “Perguntado se alguma vez recebeu um ou mais cadáveres entregues pela DGS para sepultar, respondeu que sim, com muita frequência. Esclarece que era um veículo todo o terreno de cor verde e caixa fechada que lhe levava os corpos. Perguntado acerca da frequência dessas entregas, respondeu que era grande. Recorda-se de ter recebido, por vezes, dois e três corpos no mesmo dia. Perguntado se sabe explicar a causa de tantas mortes, respondeu que não, que nem sequer via os cadáveres pois estes lhe eram apresentados envoltos numa manta e o declarante sepultava-os assim mesmo. Por outro lado, esclarece ainda não dispor de qualquer documentação e que a existir um registo destas inumações será na câmara municipal; ao declarante os agentes da DGS apenas exibiam uma ordem escrita para sepultar os cadáveres, mas não sabe precisar de quem provinha essa ordem.” Nos primeiros dias de Junho de 1967, Nampula informou a direcção em Maputo de que tinha na sua posse mais de nove contos pertencente aos presos que tinham morrido. Os valores não tinham sido entregues às famílias porque desconheciam o paradeiro das mesmas, alegavam, pelo que perguntavam se podiam usar o dinheiro para custear “funerais em atraso e, bem assim, aqueles que de futuro venham a efectuar-se”.

“Estavam ali para morrer porque eram bandidos”

 Ao longo do Verão de 1974, a comissão ouviu também muitas mulheres — mães, filhas, esposas e irmãs de desaparecidos e mortos —, na maioria dos casos na qualidade de testemunhas. Mas elas foram também vítimas do tratamento desumano da PIDE. Numa busca ilegal feita a sua casa em busca de “um cartão” do marido, já detido, a são-tomense Adelaide Augusto Batalha foi espancada por quatro elementos da polícia e perdeu alguns dentes. Muitas outras eram agredidas verbalmente à porta da subdelegação quando pediam informações sobre os seus familiares. Nos postos de vigilância e noutras subdelegações do Norte há relatos de violações e abusos sexuais perpetrados por funcionários, e mesmo em Nampula a Comissão registou um caso contado por Fernando Cohieque, ex-régulo de Vanline, preso em Abril de 1966 por ter “permitido” que a Frelimo atravessasse as suas terras. Numa das visitas da sua mulher, que lhe levava comida à cadeia, Ramos disse-lhe que ela “era muito bonita” que não “precisava de viver com um preto”. Cohieque queixou-se ao inspector Francisco da Costa Lontrão e este terá repreendido o subordinado. Contudo, numa visita posterior, “Ramos seguiu atrás da mulher, abordou-a e por meio de ameaças conseguiu com ela relações sexuais”. À data deste auto, esta mulher já tinha morrido. O Ramos mencionado pelas vítimas era António Francisco Baptista Ramos, um guarda prisional que chegara a Moçambique em 1964, tal como o seu colega Bento Maria. “Eram quem mais batia nos presos”, contou Valentim Bolacha, um antigo recluso que foi recrutado pela PIDE em 1965 e ficou a trabalhar como cabo auxiliar. Bento Maria e Ramos eram de Serpa e tinham cães que usavam como instrumentos de tortura: o Popeye e o Boby, sendo este último mais mencionado pelas vítimas. Estes dois guardas, que trabalhavam nas duas cadeias geridas pela corporação, foram frequentemente identiÆcados perante a comissão como autores de actos criminosos. Aiamar Muacoma contou a “morte diferente” dos seus companheiros Mário Namaneque e Hinvia: “Depois de terem levado bastante tareia nos interrogatórios, foram levados para os calabouços da PSP onde o guarda Bento Maria lhes queimou, à vista do queixoso e doutros presos, os testículos, o pénis e toda a zona púbica com um archote improvisado com jornais enrolados.” O mesmo momento foi testemunhado por Cupela Muahamara e a mesma prática referida por muitos ex-prisioneiros e funcionários da PIDE, como o auxiliar Sebastião Choquela Esteira. “Viu pelo menos duas vezes o guarda Bento Maria queimar a piça dos presos com capim a arder, empurrando-os com o fogo para junto do cão Boby, o qual mordia os presos.” Ramos fazia o mesmo, segundo Rodrigues Numanle, um cozinheiro de 39 anos, que o viu “deitar gasolina nos testículos” de um recluso chamado André Navinho e que, “acendendo um fósforo, deixou arder”. “[O preso] foi transportado para o hospital a fim de receber [tratamento] o mesmo dia e vindo [para a cadeia] nesse mesmo dia. Saindo em liberdade desta polícia em 1968 veio a morrer em sua casa, aproximadamente um mês depois.” “Era raro o dia em que não morria ninguém”, disse Numanle aos oficiais da comissão. A maioria das mortes decorria das torturas feitas nos interrogatórios, onde os pides usavam palmatórias, “kuekueros”, chicotes, “cavalos-marinhos”, catanas e ferros. Nos gabinetes 1 e 3 da subdelegação existia uma trave suspensa do tecto onde penduravam os presos, amarrados pelos pés ou pelas mãos — pendurados, eram sovados ou chicoteados. Eram também submetidos à tortura da “estátua”, obrigados a estarem de pé, imóveis, com os braços levantados e estendidos à altura dos ombros. Quando perdiam os sentidos reanimavam-nos com baldes de água fria. Selege Mupia, agricultor de Ribuaè, foi torturado durante os primeiros três meses de detenção e nomeou aos instrutores militares os amigos que viu morrer na cadeia: “Massurupanha Nicuma Mulina morreu na sua cela que era a do declarante depois de o Ramos o ter agredido a cavalo-marinho até cair por terra saltando-lhe então em cima com ambos os pés (morreu no dia seguinte à agressão); Nicua Uela morreu logo a seguir a ter sido violentamente agredido pelo Ramos; Nacuruma Mirasse Mutual morreu em casa uma semana depois de ter sido libertado; Rapaneque Inhala Rissane faleceu igualmente logo a seguir a violenta agressão a cavalo-marinho executada pelo Ramos que o pontapeou na boca, arrancando-lhe vários dentes e o pontapeou por todo o corpo.” Num conjunto de ofícios originais da PIDE que a comissão recolheu como elementos de prova encontra-se a comunicação da morte de Massurupanha Nicuma Mulina: a chefia de Nampula informou a delegação na capital moçambicana que este cidadão tinha morrido a 23 de Setembro de 1967 por “broncopneumonia”. “O Bento Maria costumava mandar formar os presos dentro das celas dizendo-lhes que estavam ali para morrer porque eram bandidos”, contou Paulino Paconeto, preso em 1967, privado de comida e água durante os primeiros seis dias. A crueldade era desmedida: Paulino ficou sem três dentes e sem as unhas das mãos; Cavula, antigo cabo, ficou surdo do ouvido direito; Jacinto Silva, motorista, perdeu a visão.

Farinha, feijão e caril 

 À entrada na subdelegação, a revista dos detidos resultava muitas vezes em roubos de dinheiro e bens (relógios, cintos, documentos, carteiras, sapatos, camisas ou calças); o mesmo acontecia com alguns géneros alimentares que ali eram entregues pelas famílias. Munova Gaiaia, chefe de povoação em Ribuaè, declarou que um dia, em resposta à súplica para beber água, um agente “mijou numa lata” e obrigou-o a beber. “Havia outros agentes que usavam o mesmo sistema”, acrescentou. Faustino Sumaila testemunhou que um dos reclusos “foi obrigado a comer com o prato em cima da retrete, que não tinha tampa e estava cheia de porcaria, pelo guarda Ramos para servir de exemplo aos outros presos”. Para saber como era e em que consistia o fornecimento de refeições nas duas cadeias, os instrutores militares consultaram e recolheram o arquivo desta subdelegação. Por isso, juntaram ao inquérito documentos que mostram que em Janeiro de 1974, por exemplo, a alimentação era deficiente e escassa: ao pequeno-almoço era apenas dado chá e o almoço e o jantar consistia sempre em farinha, feijão e caril; ao domingo, excepcionalmente, o dia começava com açúcar com farinha e ao almoço havia carne e arroz. Os reclusos inquiridos pelos militares nunca mencionaram carne e arroz, mas antes farinha celeste, feijão e por vezes peixe seco. Sempre em pouca quantidade e de má qualidade. Em Janeiro de 1973 as compras para a subdelegação constavam somente de farinha, feijão, óleo e farinha para cães. Embora nunca tenha sido possível apurar quantas pessoas foram presas pela PIDE em Nampula — muitas não foram registadas nem tinham fichas de presos —, vários depoimentos indicam que os dois lugares de reclusão nunca tiveram, desde finais dos anos 60, menos de 300 detidos. O motivo, quando documentado, era invariavelmente o mesmo: “Averiguações.” Em data incerta, mas ainda na década de 60, a PIDE e a PSP procuraram resolver o problema da sobrelotação das celas com uma solução que, segundo as duas forças policiais, beneficiava toda a gestão colonial: trabalhos forçados. “Se os presos que estavam na PSP não tivessem saído todos os dias para irem trabalhar, muitos mais teriam adoecido pois as condições das celas eram más”, assumiu Baptista Ramos num interrogatório feito em Ænais de Maio. A mão-de-obra penitenciária foi explorada por particulares e instituições públicas: em Nampula, os presos trabalharam sem remuneração na construção da nova cadeia, no campo de aviação, na abertura de valas e estradas, nos campos de amendoim, arroz e milho, em estabelecimentos comerciais, no hospital Egas Moniz, em serrações e em obras camarárias. Alguns exerceram também tarefas domésticas nas casas de dirigentes da PIDE e da PSP.

Cadáveres embrulhados em mantas e inumados sem registo

  Em finais dos anos 1960 “morria muita gente” nos calabouços da PIDE, admitiram as mais de três dezenas de elementos da PSP inquiridos pela comissão. Muitas vezes, seis pessoas em apenas um dia. As mortes eram comunicadas à direcção em Maputo, através de ofícios breves nos quais se identificava o morto, a data e o local de óbito (“nesta subdelegação”, “nas prisões privativas da PSP” ou no hospital da cidade). Cópias destes documentos foram agregadas aos processos-crime. Em muitas, lê-se a manuscrito: “Decl. Bento Maria. Dr. Cruchinho”, isto é, a declaração de óbito tinha sido feita pelo guarda prisional e pelo médico que colaborava habitualmente com a PIDE, quase sempre nas celas. Era ainda o guarda quem requeria a certidão de óbito à Conservatória dos Registos de Nampula, informando a mesma da causa de morte: “Insuficiência cardíaca” ou “broncopneumonia” ou “nefrite aguda” ou “poliavitaminose”. Segundo testemunhas, os cadáveres podiam ficar horas ou dias até serem retirados das celas. Paulino Paconeto contou que na sua cela chegaram a estar cinco corpos que aguardaram três dias para serem retirados. “O cheiro que exalava era nauseabundo tornando o ar irrespirável.” Na PSP, o agricultor Mucueta Mucumpua Alucasse viu morrer sete presos num só dia: “Os cadáveres eram removidos às 15 horas de cada dia, pelo que muitos cheiravam bastante mal quando os retiravam.” Nem todos os mortos eram inumados no cemitério. Interrogado pela comissão, Joaquim Alves do Nascimento, auxiliar e intérprete da PIDE desde 1962, disse que nas cadeias “morreu muita gente quer por doença quer por maus tratos quer ainda pela má alimentação que lhes era dada e que depois era levada no jipe da PIDE para local que se desconhece”. “Esse transporte”, continuou, “era efectuado pelos guardas prisionais Ramos, Bento Maria, Graça e Madureira.” Baptista Ramos, ouvido pelos militares, negou as inumações fora dos cemitérios, mas reconheceu que os cadáveres ficavam “24 horas dentro das celas” e que depois eram “embrulhados em mantas e transportados no jipe para o cemitério”. A comissão decidiu então ouvir o coveiro. Abílio Roda depôs a 11 de Junho perante Nuno Brederode dos Santos e Manuel Ferreira da Cruz: “Perguntado se alguma vez recebeu um ou mais cadáveres entregues pela DGS para sepultar, respondeu que sim, com muita frequência. Esclarece que era um veículo todo o terreno de cor verde e caixa fechada que lhe levava os corpos. Perguntado acerca da frequência dessas entregas, respondeu que era grande. Recorda-se de ter recebido, por vezes, dois e três corpos no mesmo dia. Perguntado se sabe explicar a causa de tantas mortes, respondeu que não, que nem sequer via os cadáveres pois estes lhe eram apresentados envoltos numa manta e o declarante sepultava-os assim mesmo. Por outro lado, esclarece ainda não dispor de qualquer documentação e que a existir um registo destas inumações será na câmara municipal; ao declarante os agentes da DGS apenas exibiam uma ordem escrita para sepultar os cadáveres, mas não sabe precisar de quem provinha essa ordem.” Nos primeiros dias de Junho de 1967, Nampula informou a direcção em Maputo de que tinha na sua posse mais de nove contos pertencente aos presos que tinham morrido. Os valores não tinham sido entregues às famílias porque desconheciam o paradeiro das mesmas, alegavam, pelo que perguntavam se podiam usar o dinheiro para custear “funerais em atraso e, bem assim, aqueles que de futuro venham a efectuar-se”.

2 comentários:

  1. Até parece que esse pasquim é exemplo para a sociedade!!

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  2. Cuelho, onde está a cuelha e o limpa bosta?

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