“O meu marido e os companheiros foram vítimas de um julgamento manipulado em Miami”
Elizabeth Palmeiro Casado esteve em Portugal para angariar apoios na luta pela libertação do marido. Ao DN, denuncia a falta de justiça do processo dos ‘ cinco heróis’, conta como a filha mais nova conheceu o pai aos 5 anos numa prisão de alta segurança em Miami.
Em Cuba, o seu marido, Ramón Labañino, é um herói, mas para os EUA é um espião e um terrorista. Como é que isso aconteceu? O meu marido é um dos cinco cubanos detidos em setembro de 1998 nos EUA por se ter infiltrado em grupos terroristas da contrarrevolução em Miami. As autoridades cubanas avisaram as norte- americanas dos planos terroristas, mas a única coisa que os EUA fizeram foi deter os cinco. Foram acusados de conspiração. Que é um daqueles crimes em que não se tem de apresentar provas, é algo diabólico. O meu marido e os companheiros foram vítimas de um julgamento manipulado, já que Miami é a única cidade dos EUA onde não pode haver um processo justo contra defensores da Revolução Cubana. Foram condenados a que penas? Após um julgamento de sete meses, foram condenados a penas altas, perpétuas. Nesse momento começou o recurso e uma campanha internacional, porque o Governo cubano decidiu contar ao mundo a injustiça de que os cinco foram alvo. O recurso alterou as penas? Em 2005, o tribunal de recurso de Atlanta decidiu anular todo o processo, por considerar que Miami não era uma cidade justa. Mas o Governo dos EUA apelou e a decisão foi revogada. Em 2008, o tribunal ditou a necessidade de mudar a sentença a três deles. Dois já foram libertados após cumprir as penas. O meu marido, até aí condenado a prisão perpétua mais 18 anos, viu a sentença reduzida para 30 anos. Falta cumprir dez. Quando foi a última vez que o viu? Há menos de um mês. Faço parte dos familiares que conseguiram visto e visito- o, com mais ou menos regularidade. Cheguei a estar dois anos e meio sem conseguir o visto. Com o Presidente Obama a situação melhorou um pouco e posso visitá- lo, em média, duas vezes por ano. Vou com as nossas filhas, que agora têm 17 e 21 anos. Viajo com elas para ver o Ramón desde que tinham 5 e 9 anos. Como é que tem sido para elas? Quando o prenderam, a mais nova tinha 1 ano e a mais velha 5. Não sabiam o que se passava. Eu dizia que ele estava a trabalhar em Miami. Quando apareceram os cartazes com as fotos deles, perceberam que o pai estava preso. Mas não porque fosse uma pessoa má. Tentei que, no meio de tudo, tivessem uma vida o mais normal possível. Em Cuba, os cinco são quase venerados, e quando és criança isso pode criar problemas. Não é normal conhecer o pai numa prisão de alta segurança, como aconteceu à mais nova, com 5 anos. É uma experiência que não desejo a ninguém. Como são as condições na prisão? Ele está há um ano numa prisão de baixa segurança, mas já esteve numa de alta segurança, perigosa, rodeado de verdadeiros criminosos, e noutra de média segurança, depois de lhe terem diminuído a sentença. Desde que foram presos, os cinco mantiveram um otimismo e uma força, que é o que inspira os familiares a manter esta batalha. O Ramón não nos deixa esmorecer. Continua otimista, confiante. Às vezes, no decorrer dos dias, dos meses, dos anos, perdemos força, porque não estávamos preparados para uma situação como esta. Não imaginávamos que fosse durar tanto tempo. Para mim, uma chamada telefónica de Ramón é o máximo, uma visita enche- me de energia. Como funcionam os telefonemas? Cada preso tem direito a 300 minutos por mês e ele distribui o tempo pela minha casa, pela da filha mais velha, fruto do primeiro casamento, pelos pais, pelos irmãos, pelos advogados... Também usa uma espécie de correio eletrónico. Não tem acesso à internet, é um sistema específico para presos. Escreve- me a contar tudo e as filhas contam- lhe as coisas da sua vida, da escola, dos namorados. É como se estivesse em casa. É muito ciumento dos namorados, acha que as filhas ainda são pequenas. Mas quando vamos às visitas já não sou eu e duas crianças, somos três mulheres. Ainda há hipótese de recurso? O único recurso é um habeas corpus porque, em 2006, soube- se que havia um grupo de jornalistas pagos pelo Governo dos EUA a fazer a cobertura do julgamento na imprensa de Miami. Cuba sempre denunciou a existência de uma campanha de desinformação. Acha que algum dia podem ter um perdão presidencial? A Amnistia Internacional analisou o caso e, num relatório de 2010, pediu a Obama que pusesse fim à situação, dado todas as irregularidades. Mas Obama está de mãos atadas por causa dos interesses políticos. Resta- nos continuar a campanha de denúncia mundial, para que se saiba que não é só o povo cubano que reclama justiça. Os EUA reclamam a libertação do norte- americano Alan Gross, preso em Cuba. Acha que poderia haver uma troca? O Governo dos EUA tem pedido a Havana para libertar incondicionalmente esse senhor, que estava em Cuba a cometer crimes sancionados também noutros países [ fornecia material informático e telefones satélites sem autorização]. O Governo cubano disse estar disposto a sentar- se para negociar e encontrar uma situação mutuamente vantajosa, com bases humanitárias. O Governo dos EUA não respondeu, não quis analisar o caso. (fonte DN/Lisboa)
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