terça-feira, 30 de março de 2021

Raquel Coelho escreve artigo de opinião sobre o Órgão de Soberania que não vai a eleições e "julga" em nome do Povo

 

“JUSTIÇA” EM CAUSA PRÓPRIA

 Assustador é a palavra certa para definir a decisão do Conselho Superior do Ministério Público que ilibou as duas procuradoras do Ministério Público (MP) no caso da vigilância indevida a dois jornalistas. Não apenas pelo caso em si, mas sobretudo pelo que representa. Se pensarmos que este regime de impunidade pode ser aplicado indiscriminadamente sobre todas as ações indevidas dos nossos magistrados por mais gravíssimas que sejam é de ficar com os cabelos em pé.


 Para contextualizar, o MP ordenou à PSP fazer vigilâncias a dois jornalistas no âmbito do processo e-toupeira. Em causa, a alegada violação do segredo de justiça de Carlos Lima, jornalista da Sábado, e Henrique Machado, ex-jornalista do Correio da Manhã, atualmente na TVI. O MP pretendia saber com quem é que ambos os jornalistas contactavam no universo dos tribunais, por isso ordenaram à PSP vigilâncias para compreender com quem se relacionavam e que tipo de contactos estabeleciam com fontes do processo. Mas ao seguir um jornalista durante semanas a fio, os investigadores não vigiaram apenas as fontes do processo, mas todas as fontes com quem contactou. Violando o direito dos jornalistas, no acesso às fontes de informação e à proteção da independência e do sigilo profissionais. O caso foi tão polémico que pressionou o Conselho Superior do Ministério Público a averiguar a atuação das magistradas, mas como seria de esperar resolveram arquivar a matéria disciplinar, acharam que o “excesso e zelo” não era motivo de sanção, apesar de estarmos perante uma ação desproporcional e ilegal.


 Portugal tem de acabar com o regime legal do segredo de justiça, um regime democrático não pode permitir leis que promovam a opacidade e o secretismo, que ao fim ao cabo só vêm limitar ainda mais a liberdade de imprensa, excessivamente vilipendiadas nos tribunais portugueses. Já perdemos a conta das vezes que o Estado português foi condenado pelo Tribunal Europeu de Direitos do Homem por violação do direito à liberdade de expressão e de imprensa nos últimos anos.  


 Mais grave é se refletirmos que os tribunais estão consagrados na nossa constituição como “órgãos de soberania com competência para Administrar a justiça em nome do povo”. Mas a verdade é que o povo não lhes conferiu esse direito. Não são sufragados pela vontade popular ao contrário dos restantes órgãos de soberania. O próprio escrutínio tem de ser feito com respeitinho, confrontar um magistrado é sempre muito arriscado. No decurso da minha vida política aprendi isso da pior maneira. Eu própria e os meus colegas de partido fomos perseguidos e castigados judicialmente por sermos tão críticos da justiça. Tantos outros fazem autocensura. Muita informação de interesse público apenas corre à boca pequena ou na clandestinidade porque se for dito publicamente rapidamente acaba em condenações por difamação no tribunal. Vejam o que aconteceu com o hacker Rui Pinto.  Há muito tempo que me apercebi que nos tribunais não se faz justiça. Aplicam-se leis e muitas delas variam consoante a cara do freguês.


 Para garantir a separação de poderes e a independência da justiça, acabamos a permitir uma estrutura de poder intocável, que decide em causa própria, por conselhos compostos pelos próprios que em vez de exercerem a disciplina funcionam mais como uma corporação.


 Criamos torres de marfim dentro de um sistema que se roga democrático. Ilhas de poder que não são controladas por ninguém, senão por quem lhes pertence. Pergunto-me que tipo de justiça há nisto? (ver JM)

4 comentários:

  1. Ptp o partido defensor dos oprimidos e dos que não têm voz.
    Não vejo a hora de voltar a ver Coelho Raquel e Quintino na Assembleia.

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  2. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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