sábado, 23 de dezembro de 2023

Olhem a desfaçatez cínica deste hipócrita religioso: José Ornelas declarou que “cunhas que salvam crianças não fazem mal a ninguém”

 Por: João Miguel Tavares

O silêncio do filho Nuno e a verborreia do bispo José

 O Orçamento do Estado para 2024 prevê uma despesa de 123 mil milhões de euros. Quatro milhões de euros — o preço dos medicamentos oferecidos às duas gémeas brasileiras — são 0,003% desse valor, uma gota de água no oceano da despesa pública. Haverá certamente dinheiro muito mais mal gasto e desviado para causas menos nobres. Então, porque é que continuamos a falar do caso das gémeas, semana após semana? É simples. 1) Porque é evidente, desde a primeira hora, que houve um tratamento de favor. 2) Porque é evidente que o favor se torna mais grave por ser uma cunha médica, num hospital onde falta dinheiro para quase tudo, e num sector da saúde onde milhões de portugueses já sofreram na pele a lentidão, a ineficácia e a falta de meios. 3) Porque é evidente que todos os políticos envolvidos no caso mentem desde a primeira hora. 4) Porque é evidente que o caso reforça os preconceitos contra a classe política, com Presidente e membros do Governo a fazerem-se de sonsos e esquecidos, numa conspiração generalizada contra a inteligência dos cidadãos.
Essas são quatro razões para continuarmos a falar do caso. Mas as razões não param, e só nesta semana tivemos mais três. 1) A mudez de Nuno Rebelo de Sousa na sua chegada a Portugal, perseguido pelas câmaras de   televisão. 2) A espantosa reflexão sobre o caso do bispo José Ornelas. 3) A entrevista de Lacerda Sales ao Expresso e as alegadas explicações que forneceu sobre a sua intervenção. Vamos por partes. 1) O doutor Nuno Rebelo de Sousa não pode querer ser filho do Presidente da República na hora de pedir favores, ou de presidir à Câmara Portuguesa de Comércio de São Paulo, e depois refugiar-se no estatuto de cidadão comum para evitar dar explicações aos portugueses. A sua chegada em silêncio absoluto ao aeroporto de Lisboa, cheio de estilo e vaidade — óculos escuros à noite, boné preto da Mercedes, mochila Montblanc de 1500 euros às costas; um homem rico que ajudou amigos ricos a usufruírem dos meios limitados do SNS —, fala mais do que muitos discursos, e é mais um prego na popularidade de Marcelo Rebelo de Sousa. 2) Sem que ninguém lhe tivesse encomendado o sermão, o bispo José Ornelas declarou que “cunhas que salvam crianças não fazem mal a ninguém” — esquecendo-se de que médicos no Brasil e em Portugal puseram em causa a eficácia terapêutica do Zolgensma face ao que as gémeas já estavam a tomar no Brasil, e que os tribunais brasileiros recusaram o recurso ao medicamento, argumentando que a família não estava “em condição de pobreza” e que as crianças não estavam “desassistidas”. “Se isso é ser corrupto, então eu também quero ser corrupto”, afirmou o bispo Ornelas. Perdoai-lhe, Senhor, que não sabe o que diz. 3) O ex-secretário de Estado, Lacerda Sales meteu no saco a tese da “sede própria” e veio apresentar explicações públicas, esforçando-se por não mentir sem nunca contar toda a verdade. Confirmou que teve uma reunião com Nuno Rebelo de Sousa sobre as gémeas, e uma outra “sobre um assunto completamente diferente”: “[Ele] trouxe dois empresários, creio que da hospitalização privada no Brasil.” Nada mais acrescentou. Pelos vistos, o filho do Presidente tanto pede reuniões a um secretário de Estado por razões humanitárias, que até dão vontade ao bispo Ornelas de ser corrupto, como por razões de lobbying e de negócios. Como distinguir umas das outras? Enquanto Nuno Rebelo de Sousa permanecer em silêncio, a distinção é nula e todos podemos pensar o pior. -(Público)
 O sermão do pardalão: (o bispo José Ornelas declarou que) “cunhas que salvam crianças não fazem mal a ninguém”

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