quarta-feira, 12 de junho de 2024

Luso Brasileira ilustre faleceu com 94 anos

 1930–2024

 Maria da Conceição Tavares A luso-brasileira do PT

A economista luso-brasileira Maria da Conceição Tavares morreu neste sábado, 8, aos 94 anos, em Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, Brasil. Pertenceu ao Partido dos Trabalhadores, foi deputada federal, professora universitária e assessora económica de Salvador Allende. Nasceu em Anadia, distrito de Aveiro, em 1930, mas viveu toda a sua juventude em Lisboa. Em 1953, licenciou-se em Ciências Matemáticas na Universidade de Lisboa e, no ano seguinte, já casada e grávida da sua primeira filha, foi viver para o Brasil, para fugir à ditadura de Salazar. Adquire a cidadania brasileira em 1957, no mesmo ano em que começa o curso de Economia na Universidade do Rio de Janeiro. “Era uma mulher brilhante e profundamente comprometida com a soberania nacional, tendo atuado decisivamente na construção de um Brasil menos desigual. Era uma portuguesa que veio para o país ainda criança e virou uma brasileira de coração e de compromisso firme com o nosso povo”, disse Dilma Rousseff, logo após a sua morte. Também o Presidente Lula da Silva quis prestar homenagem à sua “amiga”, com quem teve “o prazer e a honra de conviver e conversar muito, debatendo o Brasil e os seus desafios sociais e económicos”. Maria da Conceição Tavares trabalhou em várias organismos estatais, como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, no Banco Nacional do Desenvolvimento Económico e Social e participou ainda na coordenação dos programas setoriais do governo brasileiro para a indústria metalomecânica pesada. Escreveu inúmeros artigos e vários livros, entre os quais o ensaio Auge e Declínio do Processo de Substituição de Importações, de 1972, uma obra que a Universidade de São Paulo considera um “marco no estudo do processo de industrialização do Brasil” que se tornaria um “clássico na literatura especializada". Mas acabou também por ser este livro que lhe viria a criar complicações junto do regime ditatorial que governava o Brasil na altura. Em 1968, vai para o Chile liderar o escritório da Comissão Económica para a América Latina e as Caraíbas, evitando assim ser perseguida, presa ou torturada pela ditadura militar. Já naquele país, juntou-se ao governo de Unidade Popular, de Salvador Allende, como assessora económica. Lecionou ainda na Universidade do México e, nos anos 80, foi uma das principais figuras na criação de cursos de mestrado e doutoramento na Faculdade de Economia da Unicamp (Universidade de Campinas). “Foi uma intelectual comprometida com a transformação nacional, ousou diuturnamente enfrentar a ditadura civil-militar, constituindo parte integrante do movimento da democratização do país. Deixa uma trajetória exemplar de educadora engajada no que de melhor o pensamento crítico gerou no Brasil”, disse Márcio Pochmann, atual presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Em 1994, foi eleita deputada federal pelo PT, sendo uma das vozes mais críticas da política do Presidente Fernando Henriques Cardoso. “Uma economia que diz que precisa primeiro estabilizar, depois crescer, depois distribuir, é uma falácia, e tem sido uma falácia. Não estabiliza, cresce aos solavancos e não distribui. Esta é a história da economia brasileira desde a pós-guerra”, defendeu na altura. Foi ainda colunista semanal da Folha de São Paulo, onde assinava a coluna Lições Contemporâneas, até 2004. Afastou-se aos poucos da política partidária, mas não deixou de dar a sua opinião crítica sobre muitos dos planos e programas económicos dos vários governos que lideraram o Brasil nas últimas décadas. Após a pandemia, algumas das suas conversas e aulas dos anos 90 tornaram-se virais nas redes sociais, sobretudo uma passagem de uma entrevista de 1995, no programa Roda Viva, do TV Cultura: “Se você não se preocupa com a justiça social, com quem paga a conta, você não é um economista sério. Você é um tecnocrata.” Paulo C. Santos

  

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