quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

De €540 milhões atribuídos pelo governo de Albuquerque, €332 milhões foram para empresas ou consórcios do grupo AFA

 Mais de metade do dinheiro distribuído foi parar a Avelino

Grupo AFA foi o maior beneficiário dos contratos públicos atribuídos por Albuquerque. Novo hospital da Madeira é uma das obras sob suspeita
 O grupo AFA (Avelino Farinha e Agrela) recebeu mais de metade do dinheiro atribuído por Miguel Albuquerque em contratos públicos desde que este se tornou presidente do Governo Regional da Madeira, em 2015. As empresas de construção controladas por Avelino Farinha — um dos três arguidos presos na operação que levou à demissão de Albuquerque na semana passada por suspeitas de corrupção, prevaricação, participação económica em negócio, abuso de poder, tráfico de influência e atentado contra o Estado de direito — têm tido uma posição claramente dominante na Madeira, de acordo com cálculos feitos pelo Expresso a partir dos dados disponibilizados pelo Base.gov, o portal público que centraliza informação sobre todos os contratos celebrados pelo Estado em Portugal. Dos €540 milhões distribuídos desde 2015 pelo Governo Regional, através de contratos públicos assinados pela Secretaria Regional dos Equipamentos e Infraestruturas e pela vice-presidência do Governo Regional, €332 milhões foram parar a duas empresas do grupo AFA — a Afavias e a Construtora do Tâmega Madeira — ou a consórcios de que elas fizeram ou fazem parte. Numa análise a 1042 contratos públicos assinados desde que Miguel Albuquerque assumiu a função de chefe do Executivo da Região Autónoma da Madeira, em abril de 2015, apenas 57 envolveram o grupo AFA. Esta meia centena de adjudicações, no entanto, representou 61% do bolo total distribuído pela vice-presidência do Governo Regional e pela Secretaria Regional dos Equipamentos e Infraestruturas, duas entidades adjudicantes que surgem com o mesmo número de contribuinte no portal de informação sobre contratos públicos. Embora tenha havido outras secretarias regionais a celebrar alguns contratos com a Afavias (e nenhum com a Construtora do Tâmega Madeira), no valor global de €17 milhões, o peso desses contratos é relativamente pequeno. No top 20 dos maiores contratos públicos dos últimos oito anos assinados pelo Governo Regional, 11 foram parar ao grupo AFA, sendo que a fatia do dinheiro distribuído nessa lista é ainda mais desproporcional: 79% dos €291 milhões relativos a esse top 20 foram pagos a empresas de Avelino Farinha ou a consórcios de que fizeram ou fazem parte. 

Tudo sob investigação

 Todas estas adjudicações ganhas pelas empresas de Avelino Farinha estão a ser investigadas em dois dos processos-crime em que este empresário é visado no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), de acordo com fontes judiciais contactadas pelo Expresso. “Quando há suspeitas sobre uma, tem de se investigar todas”, explica uma fonte judicial. O maior desses contratos, celebrado em outubro de 2022, diz respeito à segunda fase do projeto de construção do novo Hospital Central e Universitário da Madeira, que foi ganho, por €74,7 milhões, por um consórcio onde está a Afavias, a Tecnovia Madeira e a Socicorreia — Engenharia. 
 O CEO e principal acionista desta última empresa, Custódio Correia, é um dos arguidos detidos num dos processos-crime em curso, aberto em 2021, e em que o hospital é uma das obras suspeitas, sendo que Avelino Farinha e Pedro Calado, antigo vice-presidente do Governo Regional e presidente da Câmara Municipal do Funchal demissionário, são também arguidos nesse inquérito. A Afavias já tinha ficado, sozinha e não em consórcio, com a primeira fase da obra, para escavações e contenções do terreno, atribuída, por €18,9 milhões, em março de 2021, quando Calado era vice-presidente do Governo Regional. Este deixaria esse cargo poucos meses depois, em agosto desse ano, para conquistar a Câmara do Funchal. Se acrescentarmos às adjudicações feitas pelo Governo Regional os contratos distribuídos por todas as entidades públicas do arquipélago — incluindo a Empresa de Eletricidade da Madeira —, então o peso de Avelino Farinha na relação dos empreiteiros locais com o Estado é ainda maior. As suas empresas, de forma isolada ou em consórcio com outras companhias, faturaram €474 milhões ao Estado desde 2015, sem contar com €59 milhões ganhos com os municípios. Apesar de ser arguido em dois processos diferentes e de ser suspeito de corrupção, o ainda chefe do Governo Regional não foi chamado para interrogatório. A razão é simples: a procuradora Rita Madeira terá decidido que só depois de analisar todo o material recolhido nas buscas à casa particular e à residência oficial do governante é que estará em condições para o chamar a depor. Mais de uma semana depois de terem sido detidos pela PJ, Pedro Calado, Avelino Farinha e Custódio Correia continuam a ser ouvidos, em primeiro interrogatório judicial, em Lisboa.


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