terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

Miguel Sousa Tavares no «Expresso

 



Uma opinião insuspeita

Entretanto, fui lendo, aqui e ali, os nossos ‘especialistas’ no assunto — que são sempre os mesmo dois ou três a quem a imprensa dá palco, formatados em cursilhos nos Estados Unidos e doutrinados nos cocktails do 4 de Julho na embaixada americana.

De tão preguiçosos e desequilibrados, os seus argumentos chegam a ser pungentes. O mais irritante é o da “invasão e anexação da Crimeia ucraniana” em 2014.

Mais uma vez: a Crimeia nunca foi ucraniana, é russa há 250 anos, com a breve excepção do período entre a independência da Ucrânia, em 1991 e 2014. Mesmo quando o ucraniano Nikita Khrushchov, secretário-geral do PCUS, resolveu, numa noite de bebedeira, integrar a Crimeia na Ucrânia, as consequências práticas foram nulas ou puramente administrativas, pois todas — a Crimeia, a Ucrânia e a Rússia — faziam parte da URSS, governada por Moscovo.

 Quando a Ucrânia se tornou independente, o normal é que tivesse devolvido a Crimeia (habitada por 65% de russos e 15% de ucranianos) à Rússia, e não que tivesse ficado à espera que a Rússia se conformasse com a perda de um território que é para ela o que o Algarve é para nós.

 O segundo argumento, que repetem até à náusea e sem corar, é que tudo isto deriva da insustentável incapacidade de Putin conviver com Estados democráticos às suas portas. Não se trata, como dizem os russos, de uma questão de segurança: de verem crescer uma aliança militar, do Báltico até ao Bósforo, que nasceu para fazer frente a outra que já desapareceu, mas que, apesar disso, não pára de crescer, de se expandir e de aumentar os seus gastos militares, que já são dez vezes os de Moscovo. Não, juram eles, o que incomoda Putin não é esta postura ‘defensiva’ da NATO, não é o cerco militar, que qualquer criança que olhe para um mapa percebe: é o ‘cerco democrático’.

Miguel Sousa Tavares no «Expresso»


2 comentários:

  1. O grave não é ter uma opinião profundamente errada.
    Grave e patético é a arrogância do tom, a sobranceria de quem acha que sabe mas, afinal, foi profundamente ingénuo e baralhou tudo, num raciocínio em que ataca quem, afinal, tinha razão.
    Lamentável Miguel Sousa Tavares...

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  2. A Crimeia era da Rússia mas não habitada por russos mas sim pelos tártaros que foram depois vítimas das deslocalizações de Estaline e deportados para a outra ponta da Rússia, junto com cerca de 10 milhões de ucranianos que tiveram de desocupar as suas terras prontamente colonizadas por russos.
    A Crimeia não foi dada à Ucrânia numa “noite de bebedeira” de Krutchev mas sim através de um acordo que fez a Ucrânia ceder à Rússia uma área extensa e proporcional da sua planície de terras negras férteis situadas a norte do país alterando também aí as suas fronteiras internas. Toda esse território permanece na posse da Rússia. Gosto muito de história e de repor os factos.

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