"Passou a primeira
metade da campanha
a justificar a decisão da
rejeição do Orçamento
e a segunda metade a
parecer querer pedir
desculpa por tê-lo feito.
Que credibilidade
pode ter tal dirigente?"
«Digo à partida que aquando da
fundação do Bloco de
Esquerda tive longas conversas
políticas com vários dos
fundadores, sobretudo com o
saudoso Miguel Portas que nos
deixou prematuramente, e desde que o BE
concorreu a eleições sempre (excepto em
2011) votei neste partido. Os resultados
eleitorais mostram que a esquerda à
esquerda do PS perdeu a oportunidade
histórica que granjeou depois de 2015.
Levará tempo a ter outra e oxalá que então se
lembre dos desaires anteriores e aprenda a
não os repetir. Serão certamente outros
lideres e é de esperar que sejam também
outras as políticas. A análise mais
aprofundada dos resultados terá de vir
depois. Por agora, podemo-nos ficar pelo
mais evidente.
É preciso distinguir entre o BE e o PCP. Os
dois partidos têm um passado remoto
comum, a fractura do movimento operário
no início do século XX entre socialistas e
comunistas. O PCP pertence à facção
comunista e o BE às divergências que
ocorreram posteriormente no seio desta
facção em resultado da evolução da
Revolução russa de 1917. O que une os dois
partidos e é mais relevante para entender as
causas profundas do seu desaire nestas
eleições é que para ambos o PS é, no fundo,
um partido de direita, uma direita que se
disfarça de esquerda, mas que
verdadeiramente não o é. Esquerda
verdadeira são eles. Os seus dirigentes não o
dizem, mas pensam-no. Não imaginam
considerar a vitória do PS nestas eleições
como uma vitória de esquerda.
O PCP tem razões históricas para esta
atitude pois os comunistas e a sua base
privilegiada (o movimento operário) foram
muitas vezes vítimas das políticas socialistas
e, em parte por isso, esta atitude
anti-socialista é largamente partilhada entre
dirigentes, militantes e simpatizantes. No
caso do BE a história é mais ambígua, tal
partilha não existe nos mesmos termos e isso
foi evidente desde a fundação do partido.
Ambos os partidos têm uma tradição de
pensamento vanguardista. Quando a teoria
colapsa ante a realidade (por exemplo,
colapso eleitoral) a culpa é da realidade,
nunca da teoria. O patético discurso de
Catarina Martins na noite das eleições foi
prova cabal disso. E lembremos que, em
2011, o mesmo desprezo pela realidade levou
o BE a chumbar o Plano de Estabilidade e
Crescimento do Governo socialista (José
Sócrates), abrindo as portas para a direita
mais anti-social que o país já conheceu.
Desta vez, é mérito incondicional do PS de
António Costa ter evitado a emergência de uma “geringonça” de direita. Mesmo assim, a
porta para a extrema-direita ficou mais que
entreaberta.
No contexto português, a queda do PCP é
estrutural porque está ligada ao declínio dos
sindicatos, a base da implantação social do
partido. O PCP é um dos únicos partidos
comunistas europeus que não se renovaram
depois da queda do Muro de Berlim e por
isso ficou refém da evolução da sua base
social organizada, os sindicatos. O declínio
destes arrasta o declínio do partido. A não
renovação do PCP foi, aliás, uma das razões
da emergência e do êxito do BE. A tragédia
do BE tem sido a de, em vez de acentuar a
sua diferença, deixar que ela se vá diluindo.
Nestas eleições, ninguém notou qualquer
diferença relevante entre o discurso
bloquista e o comunista. Mas a queda do BE
explica-se pela acumulação de outros erros
nos últimos anos.
A pandemia conferiu uma nova dimensão
à fragilidade humana, durou o suficiente
para não ser considerada um acidente
menor e atingiu particularmente as
populações envelhecidas, sobretudo as
habituadas a um mínimo de protecção social
que, de repente, pareceu precioso, não por
ser satisfatório, mas por existir apesar das
deficiências. Aumentou exponencialmente o
desequilíbrio entre o medo e a esperança.
Este desequilíbrio a favor do medo criou
duas emoções colectivas distintas: o temor da precariedade acrescida e o desespero
vivido como ressentimento. A primeira
emoção alimentou o desejo da estabilidade e
foi captada quase totalmente pelo PS. A
segunda emoção alimentou o desejo do
autoritarismo necessário para partir a loiça e
foi captado pela ultradireita sob duas
formas, o autoritarismo do Estado que, em
Portugal, equivale ao saudosismo salazarista
(Chega) ou o autoritarismo do capital e do
darwinismo social, ou seja, a sobrevivência
do mais forte (IL). Nestas circunstâncias é
evidente que o BE só podia estar do lado da estabilidade para a poder fortalecer e
qualificar. Tal como fez brilhantemente o
Livre. Em vez disso, jogou tudo na aventura
de uma terceira emoção colectiva para a qual
não havia base social.
O BE não entendeu os sinais do seu
eleitorado porque o seu pensamento
vanguardista não lhe permitiu descer até
onde os cidadãos discutem, nos seus próprios
termos, os seus medos e a as suas esperanças.
Não os escutou e se algum impacto teve foi o
de os fazer suspeitar que o seu reforço
eleitoral significaria mais instabilidade. A
dirigente bloquista passou a primeira metade
da campanha a justificar a decisão da rejeição
do Orçamento e a segunda metade a parecer
querer pedir desculpa por tê-lo feito. Que
credibilidade pode ter tal dirigente? Acresce
que, se o BE tivesse aprovado o OE, este
poderia ter sido melhorado na especialidade
e em boa parte graças às propostas
tecnicamente competentes do BE. Em vez
disso acabou por objectivamente contribuir
para eventualmente virmos a ter um OE
menos bom do que aquele que teríamos se
não tivesse havido eleições. Acresce ainda
que, ao auto-infligir-se esta derrota, deixou o
PS solto para ser menos de esquerda do que
gostaríamos que fosse. O partido que
consegue dar simultaneamente dois tiros nos
dois pés só por milagre não cairia.»
Os PCs, bloquinhas e afins votaram todos no CHEGA.
ResponderEliminarO CHEGA é o novo grande Partido da Esquerda.
PS - PSD - CHEGA - os 3 grandes.