Há dias, João Galamba, actual
secretário de Estado da
Energia, referindo-se ao
programa Sexta às 9, na RTP,
da jornalista Sandra Felgueiras,
classiÆcou-o como “estrume” e
“coisa asquerosa que quer ser considerada
um programa de informação”, numa tentação
e tentativa de condicionar ou destruir a
informação que sobre si se produz.
Infelizmente para o ar que respiramos, o
secretário de Estado de Energia não foi capaz
de reconhecer o seu grave erro, limitando-se a
apagar o comentário da rede social em que o
publicara. As interferências do poder político
na comunicação social têm um rico historial
no nosso país, parecendo útil lembrar dois
episódios:
No dia 4 de Outubro de 2004, Gomes da
Silva, ministro dos Assuntos Parlamentares
do Governo de Santana Lopes, afirmou
publicamente sentir-se “revoltado com as
mentiras” e “as falsidades”, bem como as
expressões de “ódio”, produzidas sobre o Governo por Marcelo Rebelo de Sousa, nos
seus comentários políticos semanais no Jornal
das 8 da TVI. Dois dias depois, o actual
Presidente da República anunciou que
cessava o seu comentário político, após uma
reunião no dia anterior com Miguel Pais do
Amaral, presidente do Grupo Media Capital,
proprietário da TVI.
Ouvido na Alta Autoridade para
Comunicação Social (AACS), Pais do Amaral
afirmou que a reunião fora marcada antes das
declarações do ministro dos Assuntos
Parlamentares e que a mesma tinha sido “um
encontro de amigos” para pedir um
aconselhamento jurídico, tendo constituído,
para ele, uma surpresa a decisão de Marcelo
Rebelo de Sousa de cessar o seu programa na
TVI. Marcelo Rebelo de Sousa, também na
AACS, esclareceu que Pais do Amaral não lhe
havia solicitado nenhum aconselhamento
jurídico, antes lhe tendo dito que, para viver,
uma estação de televisão dependia de uma
licença estatal e de condicionalismos
económicos e financeiros do Estado e do
Governo e que era inaceitável haver na TVI
uma informação e uma opinião
sistematicamente antigovernamentais, pelo
que era necessário que Marcelo Rebelo de
Sousa repensasse a orientação dos seus
comentários, dando-lhe um prazo, para o
efeito, de “duas semanas ou um pouco mais
até ao final do mês”. Marcelo Rebelo de Sousa
demitiu-se no dia seguinte.
Na altura, a AACS concluiu que a intervenção de Gomes da Silva constituía uma
“pressão ilegítima”. José Sócrates, então
secretário-geral do Partido Socialista,
considerou que este caso era uma questão
“indigna de uma democracia adulta”,
estando-se perante “aquilo a que vulgarmente
se chama censura”, e Nuno Melo, presidente
do grupo parlamentar do CDS, afirmou que a
questão era “basicamente empresarial” e, por
isso mesmo, “não tinha dignidade bastante
para ser tratada no Parlamento”.
Quase cinco anos depois, no congresso do
Partido Socialista no início de 2009, foi
aÆrmado que a TVI estava a contribuir para
uma “campanha negra” contra o PS e, em 21
de Abril, numa entrevista à RTP, o então
primeiro-ministro, José Sócrates, classificou o
Jornal Nacional de sexta-feira da TVI,
coordenado e apresentado por Manuela
Moura Guedes, de “telejornal travestido” e de “espaço noticioso que tem como único
objectivo o ataque pessoal feito de ódio e
perseguição pessoal”.
O Jornal Nacional de sexta foi suspenso
abrupta e definitivamente em 3 de Setembro
de 2009 e, ouvidos pela Entidade Reguladora
para a Comunicação Social (ERC), tanto José
Eduardo Moniz como Manuela Moura Guedes
sustentaram que o fim do programa se deveu
a ingerências dos poderes político e
económico, denunciando que o Governo,
através de António Vitorino, tinha
infuenciado, ilegitimamente, a administração
da TVI na sua decisão de suspender o
programa, nomeadamente através de
contactos com a Prisa ou o Governo espanhol
e do recurso a mecanismos de natureza
económico-financeira.
A ERC, após uma prolongada averiguação,
não considerou demonstrada que a decisão
da administração da TVI de suspender o
Jornal Nacional de sexta tivesse sido
determinada por interferências do poder
político, interferências contudo que, hoje em
dia, creio que pouca gente duvidará de que
tenham acontecido...
Desta vez, o caso Sexta às 9 não irá,
seguramente, desembocar num fim abrupto
do programa, antes constituindo,
inequivocamente, uma indelével mancha na
carreira política do actual secretário de
Estado de Energia.
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