Um grande escritora, um espirito insubmisso
Maria Velho da Costa
Revolução e Mulheres
Elas fizeram greves de braços caídos.
Elas brigaram em casa para ir ao sindicato e à junta.
Elas gritaram à vizinha que era fascista.
Elas souberam dizer salário igual e creches e cantinas.
Elas vieram para a rua de encarnado.
Elas foram pedir para ali uma estrada de alcatrão e canos de água.
Elas gritaram muito.
Elas encheram as ruas de cravos.
Elas disseram à mãe e à sogra que isso era dantes.
Elas trouxeram alento e sopa aos quartéis e à rua.
Elas foram para as portas de armas com os filhos ao colo.
Elas ouviram falar de uma grande mudança que ia entrar pelas casas.
Elas choraram no cais agarradas aos filhos que vinham da guerra.
Elas choraram de verem o pai a guerrear com o filho.
Elas tiveram medo e foram e não foram.
Elas aprenderam a mexer nos livros de contas e nas alfaias das herdades abandonadas.
Elas dobraram em quatro um papel que levava dentro uma cruzinha laboriosa.
Elas sentaram-se a falar à roda de uma mesa a ver como podia ser sem os patrões.
Elas levantaram o braço nas grandes assembleias.
Elas costuraram bandeiras e bordaram a fio amarelo pequenas foices e martelos.
Elas disseram à mãe, segure-me aí os cachopos, senhora, que a gente vai de camioneta a Lisboa dizer-lhes como é.
Elas vieram dos arrebaldes com o fogão à cabeça ocupar uma parte de casa fechada.
Elas estenderam roupa a cantar, com as armas que temos na mão.
Elas diziam tu às pessoas com estudos e aos outros homens.
Elas iam e não sabiam para onde, mas que iam.
Elas acendem o lume.
Elas cortam o pão e aquecem o café esfriado.
São elas que acordam pela manhã as bestas, os homens e as crianças adormecidas.
Maria Velho da Costa
“Um imenso vazio”, nas reacções à morte de Maria Velho da Costa
Maria Teresa Horta, co-autora das Novas Cartas Portuguesas, dedica-lhe um poema e fala de uma “ligação para sempre” com a escritora. Do mundo das letras e da política surgem também condolências e elogios à obra da autora de Casas Parda -Ver PÚBLICO
O PROCESSO DAS TRÊS MARIAS: HISTÓRIA DE UM JULGAMENTO por Felipa Mourato e Helena Amaral
Em 1973, neste mesmo dia 25 de Outubro, as escritoras Maria Teresa Horta, Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa entraram no Tribunal da Boa-Hora para a primeira audiência do seu julgamento. Acusadas pelo Estado português de terem escrito um livro pornográfico e atentatório da moral pública e bons costumes, intitulado Novas Cartas Portuguesas, as Três Marias ficariam conhecidas em todo o mundo pelas repercussões deste julgamento, classificado como a primeira causa feminista internacional. Para nós, feministas de hoje, elas representam dignidade, coragem e liberdade. No feminino, que é o que a nós importa, e o que hoje aqui celebramos.
Foram vários os motivos que levaram Maria Teresa Horta, Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa a escolher as Cartas Portuguesas, de Mariana Alcoforado, como inspiração para as Novas Cartas Portuguesas “embora o tema principal fosse sempre a condição das mulheres ao longo da História.” O livro que escreveram é uma obra singular e notável. Por “consistir em 120 textos que entrecruzam cartas, poemas, relatórios, textos narrativos, ensaios e citações, escritos colectivamente por três autoras, que, contudo não os assinam individualmente, problematizava já, esbatendo, as noções estabelecidas de autoria e de géneros literários. Ao mesmo tempo, do ponto de vista histórico-social, as críticas que o livro tecia à sociedade contemporânea portuguesa, abordando temas censurados ou temas tabu, como a guerra colonial, o enquadramento institucional da família católica, ou o estatuto social e legal das mulheres, gerou, no contexto do Estado Novo, fortes reações por parte daqueles ligados ao poder.”
E, de facto, acabado de imprimir em finais de Abril de 1972, o livro começa a ser distribuído em Portugal e no Brasil. Será ainda objecto de algumas notícias e críticas nos jornais nacionais, mas a sua apreensão pela polícia ocorre quase de imediato. Na base da apreensão está a classificação, por parte da Censura, como sendo uma obra que contém “algumas passagens francamente chocantes por imorais, constituindo uma ofensa aos costumes e à moral vigente no país”, e que “preconiza sempre a emancipação da mulher em todos os seus aspectos”. Na conclusão do despacho avaliador, o censor apresenta o seu parecer: que se proíba a circulação do livro, enviando-se o mesmo à Polícia Judiciária para efeitos-de instrução de processo-crime. E assim aconteceu.
Segue-se a “perseguição política, a proibição da venda da obra, os passaportes apreendidos, as idas à Polícia Judiciária no mesmo sector onde eram interrogadas as prostitutas, ou seja, na Polícia encarregada da averiguação dos delitos comuns (…)”(in Ana Luísa Amaral e Marinela Freitas, Novas Cartas Portuguesas, Entre Portugal e o Mundo, D. Quixote, 2014). Os interrogatórios das autoras começam a 5 de Junho de 1972. A acusação formal surge a 12 de Dezembro. E o despacho de pronúncia e estabelecimento da caução a 16 de Fevereiro de 1973.
Pese embora o silenciamento imposto pela Censura, que impedia a publicação de notícias sobre o caso, foram vários os escritores, intelectuais e políticos portugueses que manifestarem o seu apoio às autoras. E através do envio clandestino de exemplares do livro a organizações e mulheres feministas de diferentes países, vai criar-se uma enorme onda de solidariedade com as autoras e de protesto contra a apreensão do livro e contra o processo movido pelo Estado português. “De facto, as primeiras notícias na imprensa internacional começam a circular sensivelmente após a acusação formal, nos primeiros meses de 1973, aludindo ao processo instaurado às autoras. Porém, será a partir da Conferência da NOW (National Organization of Women), realizada a 3 e 4 de Junho, nos Estados Unidos, que a atenção dada pela comunidade e pela imprensa internacional ao que viria a ficar conhecido como o caso das “Três Marias” se intensificará. (…) É por esta altura também que as embaixadas e os consulados portugueses, um pouco por todo o mundo, começam a ser invadidos com petições, abaixo-assinados, cartas-protesto contra a prisão das autoras, pedidos de clemência, pedidos de autorização para assistir ao julgamento, pedidos de exemplares do livro, pedidos de informação sobre a situação política do país e sobre o contexto jurídico e social da mulher portuguesa e, mesmo, ameaças de boicote a produtos portugueses. Ao mesmo tempo, as instalações diplomáticas portuguesas no estrangeiro tornam-se palco de diversas manifestações e ações de protesto, algo que perdurará até ao final do julgamento, no ano seguinte.” (in Ana Luísa Amaral e Marinela Freitas, Novas Cartas Portuguesas, Entre Portugal e o Mundo, D. Quixote, 2014).
A primeira audiência acontece a 25 de Outubro de 1973, no Tribunal da Boa-Hora, mas é de tal forma concorrida, que o juiz declara-a secreta, e ordena o abandono da sala por parte de jornalistas e organizações nacionais e internacionais que pretendiam assistir.
Em Novembro de 1973, o Governo Português faz uma tentativa de terminar com o processo que lhe causava crescentes problemas de contestação internacional: o Ministério da Justiça contacta as autoras, e propõe-lhes uma retractação pública na qual declarassem que não tinham intenção de “ofender o Governo, nem o bom nome de Portugal”. A proposta é recusada e o julgamento continua. A leitura da sentença, inicialmente marcada para 18 de Abril de 1974, é adiada para substituição do representante do Ministério Público e, a 25 de Abril, dá-se a revolução.
A sentença será proferida a 7 de Maio de 1974 promulgando a absolvição das rés. Na fundamentação da sua decisão, o juiz do processo concluirá: “(…) o livro Novas Cartas Portuguesas não é pornográfico nem imoral. Pelo contrário: é obra de arte, de elevado nível, na sequência de outras obras de arte que as autoras já produziram.”
Para a História deste país, fica o último caso de perseguição de escritores por parte do regime ditatorial que o governou durante quatro décadas. Em nós, feministas de hoje, vivem as palavras de três mulheres livres que há 44 anos se juntaram e disseram: “E se escrevêssemos um livro juntas?”. (fonte)
A primeira audiência acontece a 25 de Outubro de 1973, no Tribunal da Boa-Hora, mas é de tal forma concorrida, que o juiz declara-a secreta, e ordena o abandono da sala por parte de jornalistas e organizações nacionais e internacionais que pretendiam assistir.
Em Novembro de 1973, o Governo Português faz uma tentativa de terminar com o processo que lhe causava crescentes problemas de contestação internacional: o Ministério da Justiça contacta as autoras, e propõe-lhes uma retractação pública na qual declarassem que não tinham intenção de “ofender o Governo, nem o bom nome de Portugal”. A proposta é recusada e o julgamento continua. A leitura da sentença, inicialmente marcada para 18 de Abril de 1974, é adiada para substituição do representante do Ministério Público e, a 25 de Abril, dá-se a revolução.
A sentença será proferida a 7 de Maio de 1974 promulgando a absolvição das rés. Na fundamentação da sua decisão, o juiz do processo concluirá: “(…) o livro Novas Cartas Portuguesas não é pornográfico nem imoral. Pelo contrário: é obra de arte, de elevado nível, na sequência de outras obras de arte que as autoras já produziram.”
Para a História deste país, fica o último caso de perseguição de escritores por parte do regime ditatorial que o governou durante quatro décadas. Em nós, feministas de hoje, vivem as palavras de três mulheres livres que há 44 anos se juntaram e disseram: “E se escrevêssemos um livro juntas?”. (fonte)
Sr Bispo faça favor de começar a andar com alguns cartazes consigo quando estiver em grandes eventos religiosos.Num pode escrever "este é maçónico", noutro, "este segue uma espécie de buda" e outros, conforme a pessoa que se colar a si para as fotografias.
ResponderEliminarBispo anda no meio de todas as ovelhas sejam elas de que credo forem.
EliminarComentário tão ignorante o teu.
Talvez não me fiz entender. Refiro-me aos políticos que usam a imagem do Bispo, padre, procissão etc, para faturar votos. Mas pior ainda é quando se é maçónico(cujo objetivo é exatamente tentar destruir a igreja de Cristo) , ou budista, por exemplo, e se tenta enganar e os eleitores,fazendo-se passar por catolicos
EliminarComo o padre Martins?
EliminarA Raquel tb é uma grande escritora.
ResponderEliminarSó é pena Coelho não publicar os artigos dela no Pravda.
O Coelho mudou cor do blogue depois de 10 anos.
Coelho tirou vermelho parece Coelho renega comunismo. Já renega Deus renega Comunismo.
Vai ser bonito ver Coelho candidato a Presidência da República a debater com os outros candidatos Tino de Rans Marcelo e o monárquico Albuqueque.