Rui Pinto, denunciante ou criminoso?
Juíza de instrução não considera hacker português um whistle-blower. Defesa insiste no estatuto de denunciante e lembra as investigações que se seguiram às fugas de informação, como o recente Luanda Leaks.
Soube-se nesta segunda-feira que Rui Pinto é a única fonte de informação do Luanda Leaks, assim o confirmaram os advogados do hacker português. Esta investigação, embora não tenha nada que ver com o caso do Football Leaks, vai ajudar a defesa de Rui Pinto a acentuar a importância do hacker e a reforçar aquilo que sempre têm defendido. "Rui Pinto é um denunciante", disse William Bourdon, o advogado francês que tem apoiado o hacker. "Do tipo não habitual - porque não tem qualquer ligação com o meio em questão, ou com a denúncia, mas é um denunciante. E também apesar de os seus métodos não serem legais. Correu muitos riscos."
Ao DN, Bourdon acentua: "O Rui Pinto é o Edward Snowden da corrupção internacional." Mas poderá alguém sem qualquer relação com o crime em questão, por ter andado a "pescar" em computadores alheios, ser considerado um denunciante, ou whistle-blower, segundo a terminologia internacional?
Desde o início que a estratégia da defesa passa por afirmar isso mesmo, que o português é um denunciante e deveria ser protegido. Mas as autoridades judiciais portuguesas têm tido outra opinião. Há várias questões em causa: o facto de Rui Pinto ter entrado em computadores do próprio sistema judicial, o facto de não ter colaborado com a justiça e ainda a acusação de que terá tentado obter proveitos com a informação obtida, por via de chantagem.
A ex-eurodeputada Ana Gomes, que ainda nesta sexta-feira exigiu que Rui Pinto fosse considerado um denunciante, já afirmara que "por várias vezes, e até por escrito, Rui Pinto se manifestou interessado em colaborar com a justiça portuguesa", mas que "as autoridades portuguesas apenas querem encarniçar-se contra ele ou querem a sua cooperação na medida em que Rui Pinto possa dar mais dados para se incriminar", justificou. Segundo Ana Gomes, o hacker teria feito "várias denúncias anónimas" entre 2017 e 2018 na plataforma de denúncias do Ministério Público. "Nenhuma delas foi investigada", alertou a antiga eurodeputada.
Rui Pinto acabou por ser acusado de 90 crimes, no processo que há de ir a julgamento e começou com a denúncia da tentativa de extorsão à empresa de direitos de futebol Doyen, sem que o Ministério Público tenha pedido qualquer atenuante. "O arguido retrata-se como um whistle-blower da corrupção no futebol, em concreto relativamente a atividades que entendia ilícitas praticadas pela assistente Doyen, mas pretendia o arguido enquanto whistle-blower obter rendimentos regulares para si, para a sua namorada e para a manutenção do projeto Football Leaks", considerou a juíza de instrução Cláudia Pina.
Ainda que se encontrasse em investigação a prática de ilícitos pela Doyen, segundo a juíza, "a soma de dois males nunca pode produzir um bem" e a prova obtida de eventuais crimes seria considerada "nula". Porque estavam em causa os próprios crimes de que Rui Pinto está acusado: "Violação dos direitos fundamentais à privacidade, intimidade da vida privada e inviolabilidade da correspondência, mediante a prática de crimes informáticos."
Cláudia Pina refere, no acórdão de instrução, a diretiva de proteção de whistle-blowers(alertadores ou denunciantes), aprovada em 16 de abril último, por 591 membros do Parlamento Europeu e que protege apenas aqueles que denunciaram crimes "no âmbito de uma relação laboral, comercial ou similar". Rui Pinto não é, por isso, considerado um whistle-blower ou "um denunciante de boa-fé". Não tinha "qualquer relação com a assistente Doyen e demais ofendidos, tendo obtido o conhecimento dos factos, cobertos por sigilo comercial, de modo ilícito, designadamente apropriando-se de credenciais de acesso ao sistema informático da assistente", entende a juíza, que invoca ainda "a quantia de meio milhão de euros" que terá sido exigida à Doyen, uma conduta com "os elementos típicos do crime de extorsão".
Para o jurista Rui Pereira existem "limites" na concessão deste estatuto e "a proteção legal não se pode estender a pessoas que são perseguidas por atividades criminosas, como acesso ilegítimo, violação de segredo, extorsão ou ofensa a pessoa coletiva". "O pirata informático (ou hacker) que, fora do contexto de uma organização, acede ilegitimamente aos seus dados e devassa a respetiva atividade não é um mero denunciante, (...) é um verdadeiro agente provocador", diz o antigo ministro da Administração Interna num parecer.
"Se admitirmos que alguém aceda ilegitimamente aos dados de outra pessoa qualquer, singular ou coletiva, pública ou privada - seja por avidez, como na extorsão, seja até com uma motivação mais altruísta -, estaremos a reconhecer ao Estado a possibilidade de obter dados de forma ínvia, muito para lá das competências atribuídas à própria polícia", sustenta o jurista.
Defesa de Rui Pinto paga por fundação que protege whistle-blowers
Rui Pinto está a ser defendido pelo francês William Bourdon, famoso advogado de "denunciantes" como Julian Assange e os bancários que deram origem aos Lux Leaks e Swiss Leaks. Faz parte do conselho consultivo da The Signals Network, uma fundação franco-americana que "também representou os notáveis denunciantes Edward Snowden e Antoine Deltour", e que está a pagar a defesa legal do hacker português.A diretora executiva da The Signals Network, Delphine Halgand-Mishra, sublinha que estas fugas do futebol "foram investigadas por grandes organizações internacionais de media, incluindo a Der Spiegel, Mediapart e outros membros de European Investigative Collaborations (EIC Network), durante vários anos". Diz ainda que "muitas revelações do Football Leaks iniciaram processos judiciais e investigações em toda a Europa, França, Suíça, Espanha e até nos Estados Unidos. Por todas estas razões, Rui Pinto merece ser apoiado por todos aqueles que estão empenhados em defender a liberdade de imprensa e o jornalismo de investigação."
Um dos trabalhos da Signals é focar-se no apoio a "colaborações investigativas", para que as redações sejam mais bem equipadas para trabalhar de forma proativa com os denunciantes. Fornecem aos parceiros de media acesso a especialistas em segurança e uma rede de advogados a quem podem indicar potenciais denunciantes que precisem de assessoria jurídica, juntamente com recursos para jornalistas e denunciantes.
PJ continua a tentar colaboração
Ao que o DN apurou, a PJ continua a tentar esforços para que Rui Pinto fale com as autoridades e ajude a abrir o material que está encriptado e na posse daquela polícia. Até agora, a recusa do hacker em colaborar com a justiça portuguesa tem sido vista pelas autoridades judiciais com alguma apreensão. A investigação portuguesa está na posse de todos os discos rígidos com a informação obtida por Rui Pinto, muitos deles encontram-se encriptados e o hacker não demonstrou vontade de os partilhar com a PJ.
Ana Gomes continua a afirmar existirem "dois pesos e duas medidas" em relação ao hacker português, e descreve como "completamente obsoleta a posição daqueles que no sistema judiciário [português] não querem conhecer a luta, que é serviço público, por parte de um denunciante que expõe criminalidade organizada. A prisão de Rui Pinto desincentiva. Pode explicar-se porque o MP não procurou Rui Pinto, residente na Hungria, para obter a sua colaboração, como fizeram autoridades de outros Estados? E tendo-o detido, porque ainda não tratou de assegurar a sua cooperação, mesmo prosseguindo investigação sobre os crimes que lhe imputa?", tem perguntado a ex-eurodeputada. (Diário de Notícias de Lisboa)
Quantos mais portugueses como estes 2 seriam precisos, para não sacrificarmos o país a bancos e políticos(e outros).
ResponderEliminarÉ um criminoso porque cometeu um crime, ou vário.
ResponderEliminarÉ também um denunciante porque colocou em público denúncias fruto dos crimes cometidos.
Não se pode é absolver do crime, apenas porque as denúncias têm valia para investigação.
Rui Pinto, precisas formar um partido aí com a Ana Gomes. Mas, recruta só gente capaz, e de preferência honestos e cujo objetivo seja elevar Portugal.
ResponderEliminarElevar para onde?
EliminarVocê vive na lua,em marte? Assim seria mais fácil perceber a sua dúvida. Podia fazer-lhe uma lista,vou deixar-lhe uma dica, elevar por exemplo, para não deixarmos que ninguém coloque os nossos impostos no valor de 7 mil milhões de euros no novo banco, ou outro banco. Somos mesmo parvos, estupidos como umas portas.
EliminarVivo na terra e com os pés bem assentes no chão.
EliminarDaí que pergunte para que patamar se pretende elevar o país, quando ao mesmo tempo se defende que um indivíduo que cometeu vários crimes deva fundar um partido. Seria como incitar Ricardo Salgado a se candidatar às presidenciais.
Quanto ao Novo Banco, apesar de toda a demagogia à volta do mesmo, o fundo Lone Star foi o único interessado no negócio. Não houve mais nenhum. E foi assinado um contrato, que, evidentemente tem que ser cumprido.
Por outro lado, se não tivesse havido resolução, só restariam duas soluções. Uma a falência, outra a nacionalização, sendo que a primeira teria um efeito sistémico no sistema bancário de proporções inimagináveis. Qualquer uma delas seria desastrosa, e sairia nem mais cara aos contribuintes. Pelo que de três más soluções, foi escolhida a menos má.
Quanto à também demagógica ideia sobre o dinheiro nos outros bancos, é preciso separar o que foi um buraco a fundo perdido, daquilo que foram empréstimos. No primeiro caso, BPN, BPP e Banif, foram perdas para o Estado, isto é, os contribuintes. No segundo caso, BPI, BCP ou CGD, foram negócios lucrativos para o Estado, para os contribuintes. Os dois primeiros já pagaram os empréstimos na totalidade com uma taxa de juro elevada que rendeu bom lucro ao Estado. A CGD continua o seu plano de recuperação e está a pagar o empréstimo, que será lucrativo para os contribuintes portugueses, aliás os donos , através do Estado, da própria CGD.
Os adjectivos que diz caracterizarem-no, não me revejo nos mesmos, uma vez que me considero esclarecido e com conhecimentos para não embarcar em teses fáceis tão ao agrado do populismo.
Nos países com "cidadãos esclarecidos" e com "conhecimentos" os governos não "dão" aos bancos o dinheiro dos contribuintes.
ResponderEliminarNos "países esclarecidos", os bancos emprestam dinheiro aos bancos dos "países não esclarecidos" para estes emprestarem a pessoas sem as devidas garantias, para depois quando esses bancos dos "países não esclarecidos" rebentam, os "Estados não esclarecidos" terem que pagar as responsabilidades com o dinheiro dos contribuintes, esclarecidos ou não, que acabam nos bancos dos ditos "países esclarecidos".
EliminarFoi assim em Portugal, Espanha, Itália, Grécia, Irlanda, Malta, Chipre e até na Gra-Bretanha. Os bancos dos ditos "países esclarecidos", esses, foram os grandes beneficiários dos piratas que admininstravam bancos nos "países não esclarecidos".
Se os "Estados não esclarecidos" não se chegassem à frente, estoiravam os sistemas bancário e financeiro desses países, com consequências que ninguém pode sequer imaginar. Apenas fazer uma precisão, sempre catastrófica.
Quanto ao demais, não dou para peditórios populistas.
Repetindo, nos países com "cidadãos esclarecidos" e com "conhecimentos" os governos não "dão" aos bancos o dinheiro dos contribuintes. E na Grã Bretanha não dão, emprestam.
EliminarErrado.
ResponderEliminarNos países " ditos com cidadãos esclarecidos" e com "conhecimentos" também se dá dinheiro dos contribuintes, como aconteceu na "esclarecida" Alemanha com uma dádiva de 4.000.000.000€ (quatro mil milhões de euros) ao DeutchBank, ou na esclarecida Grã Bretanha onde várias dádivas dos esclarecidos contribuintes foram feitas, mesmo tendo os bancos ido à falência, como o Northern Rock.
E, nos "esclarecidos" EUA bem que os contribuintes "com conhecimentos" pagaram, sem qualquer empréstimo, a falência do Lehman Brothers e o desastre do JPMorgan. E não foram empréstimos, sem esquecer que neste esclarecido país os contribuintes "com conhecimentos" pagaram ainda para aguentar as "esclarecidas" seguradoras.
E nos ditos "países não esclarecidos" como Portugal também se emprestou, até com lucro, como ao BPI, ao BCP ou à CGD.