Francisco Teixeira da Mota
Escrever Direito
Felizmente para todos nós, em geral, e para Kiliçdaroglu, em particular, a 4 de Novembro de 1950, foi assinada, em Roma, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos
Ó ladrões, ó corruptores, se se
querem safar, basta contactar
o primeiro-ministro antes de
se envolverem nos roubos e na
corrupção, [para que]
ninguém vos possa tocar... ele
mente... mentir é certamente a
sua especialidade pessoal...
(Primeiro-ministro) você é
aquele que explora a religião
da fraternidade, do amor e da unidade para
semear a discórdia, para provocar o ódio e
alimentar a divisão... Primeiro-ministro, você
não é piedoso, você é um comerciante da
religião, um homem que explora as crenças
das pessoas piedosas...”
Estas duras palavras de Kiliçdaroglu,
dirigente do principal partido político da
oposição na Turquia, proferidas, em Janeiro
de 2012, no Parlamento e dirigidas ao então
primeiro-ministro e actual Presidente da
República Erdogan, foram consideradas
como um ataque pessoal ao
primeiro-ministro.
Para os tribunais turcos, “... o equilíbrio
entre substância e forma foi perturbado, o
limite permissível de crítica foi ultrapassado;
não era indispensável usar essas palavras para
exprimir comentários e opiniões sobre o
executivo, a crítica teria sido mais eficaz com
um estilo e uma formulação adequados”. E,
por isso mesmo, os tribunais turcos, embora
reconhecendo a qualidade de políticos dos
intervenientes, condenaram Kiliçdaroglu a
pagar uma indemnização ao
primeiro-ministro.
Kiliçdaroglu, como presidente do maior
partido político na oposição, não desertou das
suas obrigações e, dois meses, mais tarde,
noutro discurso, afirmou, entre outras coisas,
que Erdogan era um “traficante da religião”
cuja piedade era superficial, perguntando-lhe
mesmo se tinha “um único grama de
moralidade”. Foi, de novo, condenado a pagar
uma indemnização ao então primeiro-ministro
e actual ditador pós-moderno, como lhe
chama Kiliçdaroglu. Ao todo, 6350 euros para
os bolsos de Erdogan...
Mas, felizmente para todos nós, em geral, e
para Kiliçdaroglu, em particular, há 70 anos,
em 4 de Novembro de 1950, foi assinada, em
Roma, a Convenção Europeia dos Direitos
Humanos (CEDH), um instrumento jurídico
que obriga os Estados signatários a
respeitarem, na prática, os direitos
consagrados na Declaração Universal dos
Direitos Humanos. Enquanto esta declaração
é uma mera (mas muito importante)
proclamação de princípios e valores, já a
CEDH obriga, de facto, os Estados a
respeitarem os direitos aí consagrados já que prevê que os cidadãos se possam queixar das
violações pelos Estados, desses direitos e que
tais queixas sejam apreciadas e decididas por
um tribunal supranacional.
E foi o que Kiliçdaroglu fez: queixou-se ao
Tribunal Europeu dos Direitos Humanos das
suas condenações pelos tribunais turcos
constituírem uma evidente violação, pela
Turquia, da liberdade de expressão garantida
pela CEDH.
O tribunal começou por lembrar que os
dois discursos proferidos por Kiliçdaroglu
versavam questões de interesse geral e
políticas: processos judiciais relativos a
alegações de peculato, a tragédia humana
causada por um bombardeamento da Força
Aérea turca e a oposição à construção de
centrais hidroelétricas. E tinham sido feitos
no Parlamento, dirigidos ao
primeiro-ministro que, naturalmente, tinha
de suportar um escrutínio e uma crítica mais
intensa do que a generalidade dos cidadãos.
Considerou, ainda, o
TEDH que as
expressões utilizadas
deviam ser
entendidas como
opiniões e não como
afirmações de factos,
pelo que as mesmas
não deviam ser vistas
como verdadeiras ou
falsas. É certo que
eram expressões
agressivas e até
grosseiras, mas,
lembrou o TEDH,
não cabe aos
tribunais decidir o
estilo ou a eficácia da
linguagem dos
políticos ou dos
cidadãos no uso da
sua liberdade de
expressão, sendo
certo que os temas
em causa e a própria
linguagem do
primeiro-ministro
justificavam as
expressões utilizadas por Kiliçdaroglu e o seu carácter provocatório
e exagerado. E, para o TEDH, essas
expressões não tinham como objectivo
insultar Erdogan, mas manifestar uma forte
oposição ao mesmo, pelo que as condenações
constituíam uma violação da liberdade de
expressão de Kiliçdaroglu. A Turquia foi,
assim, no passado dia 27 de Outubro,
condenada a pagar-lhe os 6350 euros que
entregara a Erdogan acrescidos de cinco mil
euros por danos morais.
Feliz aniversário, CEDH! (Jornal Público)
Alguém poderá elucidar-me sobre qual será o regime no mundo atual que se aproximará mais do ideal político de José Manuel Coelho? Já sabemos que ele apoia o comunismo mas estamos com dúvidas sobre qual dos actuais estados comunistas mais o seduz: China, Coreia do Norte, Laos, Vietname ou Cuba?
ResponderEliminarCuba, porque es mas caliente.
EliminarSerá que na reforma do sistema político e da Autonomia que o Ajj fala, estará incluído a reforma da corrupção?
ResponderEliminar