45 anos depois do assassinato de Max e Maria Lurdes
A 2 de abril próximo, passam 45 anos da data em que o sacerdote católico Maximino Barbosa de Sousa e a estudante Maria de Lurdes Correia foram mortos à bomba, com a explosão do automóvel onde seguiam, na Cumeeira, de regresso a Vila Real, depois de aulas na Casa do Povo da freguesia onde alfabetizavam gratuitamente adultos em horário noturno.
O Tribunal reconheceu em 1999, e disso
lavrou sentença, que se tratou de um
atentado organizado pelo MDLP (Movimento
Democrático de Libertação de Portugal),
organização terrorista de extrema-direita
criada por António de Spínola e Alpoim
Calvão. Esta organização foi responsável por
uma onda de violência no país em 1975 e 1976 contra o 25 de Abril, com centenas de atos terroristas, incendiando sedes de partidos de
esquerda e de sindicatos, rebentando
petardos junto de casas de antifascistas,
vandalizando viaturas, tirando a vida a várias
pessoas, entre nacionais e estrangeiras. Essa
violência desabou sobre as conquistas de
Abril que se articularam na Constituição da
República, aprovada no mesmo dia em que
Max e Lurdes foram arrancados à vida pela
barbárie. Assassinados por mercenários que
contavam, entre muitas cumplicidades, com
a proteção da Espanha franquista.
É um facto que os autores morais e
materiais do atentado, levados à Justiça, não
foram condenados. A destruição de provas e
a sabotagem de investigações devido à
infiltração da extrema-direita bombista nas
entidades de investigação, como se provou
amplamente em vários casos judiciais, bem
como um julgamento no ocaso do processo,
explicam a dificuldade da sentença.
O padre Max era candidato nas listas da
UDP por Vila Real nas eleições para a
Assembleia da República que se vieram a
realizar no 25 de Abril seguinte. Um
candidato a favor da então nova
Constituição. Parece ter sido esse o pecado a
punir pelos bombistas. Que era “pecado”
confirmou toda a hierarquia da Igreja, com
especial destaque para o cónego Melo, de Braga. Saliento aqui a dor de vários jovens
padres amigos de Max que se juntaram à
vaga democrática na zona em que a
extrema-direita julgou erradamente poder
ser o seu feudo. Quando se formaram
sindicatos agrícolas no Douro, muitos
associados provinham das paróquias desses
padres, onde eles dinamizavam uma
resposta à semiescravatura em que viviam os
assalariados.
45 anos depois, muitas causas
democráticas foram vencidas, mas a pobreza
não. A subalternidade do interior do país
também não foi vencida. E essas são as
causas do êxodo das gentes do interior. O
padre Max e a Maria de Lurdes eram de
famílias de emigrantes em França. Max era
naturalmente irmão da emigração. Esteve
em França, conheceu de perto o
levantamento do Maio de 68 e toda a utopia
democrática veio com ele, migrante das
ideias, para as faldas do Marão. As causas de
Max mantêm atualidade, quando temos no
quotidiano uma democracia que encurta e
uma emigração forçada. Os contemporâneos
de Max levantaram-se para resgatar o
horizonte dos jovens. A sociedade plural,
participada e o emprego local como futuro,
aí está o manifesto pós Max mais pujante que
podemos ter!
45 anos depois, o recrudescimento da
propaganda reacionária no Portugal de hoje
obriga a reflexões várias. Uma, e à cabeça, é
não pactuar com a intolerância fascista,
racista e sexista. Não pactuar com os elogios
ao colonialismo e ao Estado Novo. Não
aceitar a linguagem vulgar da xenofobia. A
República não pode condescender com os
inimigos proclamados da Constituição e tal
exige separação política e reparação
institucional.
A memória de Max tem tudo a ver com
essa iniciativa republicana. Se há
compromisso para a República que tem de
ser feito é o da sua autodefesa constitucional.
A urgência é agora, antes que se vejam
herdeiros do MDLP no Parlamento a
condicionar um qualquer governo.
Este artigo é um apelo. Certamente,
muitos cidadãos vão assinalar os 45 anos da
Constituição, também a 2 de abril. Antes
disso, e até para isso, podemos recordar Max
em homenagem nacional, a vontade
indómita de levar a democracia mais além, o
estremeção que falta para a agonia da
política boçal. Invoca-se e convoca-se a
memória. Ela é estridente. Ouçam, é o que se
pede a todas as cores da democracia.
http://expresso.pt/sociedade/2017-03-25-A-nausea-1
ResponderEliminarAo menos saiba a história...
ResponderEliminarA propósito...
ResponderEliminarhttps://www.correiodamadeira.com/2021/02/tambem-tenho-62-anos-e-fui-da-flama.html