terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Era só que faltava. Já um pai não pode ajudar um filho, ainda por cima doutor?

 

Quem é que se lembra de um e-mail, entre milhares, de há quatro anos a esta parte? Ninguém. A não ser que seja um pedido de cunha de um filho para um tratamento de milhões. Nesse caso, não só uma pessoa se lembra como até mete o e-mail naquela pasta do “não esquecer de limpar o rasto”.

Há momentos desta jovem democracia portuguesa em que não percebo como estes actores políticos, com muita tarimba (até porque são sempre os mesmo década após década) e mais rodagem, se submetem ao ridículo das explicações públicas e imaginando que, simplesmente com isso, limpam a imagem.

Havia algumas dúvidas no caso das gémeas; julgo que todos concordaremos nisto. Mas, depois de Marcelo abrir a boca ontem, ficámos todos mais ou menos esclarecidos que, afinal, presidente ou não presidente, ele é um português comum e, obviamente, não foge a umas cunhas de quando em vez.

Que atire a primeira pedra o pai que nunca tentou desenrascar um filho.

Nada contra a demonstração de pureza lusa do nosso Marcelo na execução do habitual “jeitinho”. Está-nos nos sangue.

Mas tentar depois fazer-me de parvo é que já me aborrece.

Recebeu ele um e-mail do Doutor Nuno, “filho” para os mais próximos, que direccionou para quem de direito e fez perguntas, do género: “o que é que se faz num caso destes?”. Em seguida leu as respostas marteladas onde lhe explicavam, como se tivesse aterrado em Portugal naquele dia, que as pessoas devem procurar assistência médica no países onde pagam impostos.

Na visão de Marcelo, ele limitou-se a dar conhecimento a outras entidades de um e-mail que lhe tinha chegado, com um pedido para usar uma pequena fortuna do erário público. Faria o mesmo se fosse do doutor filho ou de outro doutor qualquer. Explicou-nos até que ele, o Presidente, deve comportar-se como um Provedor do Povo, tentando ajudar sempre que possível.

Não sei se estão a ver o cenário, mas eu posso tentar ajudar. Uma pessoa que apareceu ao lado do Marcelo, a chorar numa fotografia que correu o país, depois de ver a sua casa consumida pelo fogo, morreu sem voltar a ter um tecto seu, mas ajudou Marcelo a criar a aura do Presidente dos Afectos. Já o filho de Marcelo, com um simples e-mail, conseguiu aceder a uma fatia gigantesca de dinheiro público. Isto de ser Provedor do Povo prova-se, empiricamente, que é um campo onde há filhos e enteados. E doutores. 

Espero que por esta altura seja claro que o meu problema não é com o tratamento  e com a assistência prestada às meninas. O meu problema é quando percebo que a diferença entre a vida e a morte, casa ou rua, desemprego ou emprego, se prendem com a nossa agenda de contactos.

Marcelo tentou passar-nos um atestado de estupidez e embrulhou-se todo em explicações absolutamente dúbias, contraditórias e pouco credíveis. Vem numa linhagem, já longa, de políticos que recebem ou dão benefícios pela sua posição de poder e, quando chamados à pedra, invocam uma seriedade que simplesmente não lhes assiste para se manterem na vida pública.

Foi assim com Relvas e o curso feito com quatro disciplinas. Foi assim com Cavaco e os lucros no BPN, enquanto os comuns portugueses sofriam o calote generalizado. Foi com José Sócrates e o dinheiro da mãe. Foi com Passos Coelho e a Tecnoforma. Foi com Portas e os submarinos. Foi com o Galamba e o lítio. Foi com Isaltino e o primo da Suíça mais as contas. Foi com autarcas do PS e PSD nas intermináveis histórias de tutti-futti. Enfim, todo um rol de artistas que vão passando pela vida pública, e usando o dinheiro dos impostos a seu belo prazer, mantendo, incrivelmente, as suas posições e a cabeça erguida na rua.

Notem a cara de surpresa de Marcelo quando lhe perguntaram se era razão para se despedir. Ele nem a cunha assumiu, quanto mais ver ali um motivo para se despedir. E compreendo-o, devo dizer. Com a quantidade escabrosa de roubos que os políticos nos fazem semanalmente, a começar em ajudas de custo com moradas falsas, passando na distribuição de negócios públicos para empresas amigas e acabando no resgate da banca (esse sim, um roubo colectivo), como é que uma simples cunha daria direito a queda do presidente?

Esta malta não está boa da cabeça, Marcelo. Era só  que faltava. Já um pai não pode ajudar um filho, ainda por cima doutor? 

Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)

8 comentários:

  1. Mais triste seria se fosse entre comunas

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  2. Existem filhos que têm pais, sabe o que é?

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  3. Um lembrete: aproxima-se o fim do ano. Altura de todos os queques e membros dos diferentes órgãos de soberania reunirem a bordo de um certo navio para comer croquetes, enfrascarem-se e ver o fogo, com os seus trapinhos mais bonitos. Todos os anos é tão giro!

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    1. Vai explodir o barco ditador?
      Pareceu ameaça!!

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    2. Nota-se que não é médico, a grande noite da passagem de ano é de 30/31, parece que nunca o quiseram e nenhuma festa, que espanto!!!!!
      Essa etiqueta, é como o seu cabelo, uma SETA.

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    3. Nos,nao precisamos dos seus lembretes

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  4. Muito atraso que você estâ, isso era na sua época, agora temos o poderoso Savoy.
    Mira chato e invejoso.

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  5. O grande Savoy Palace, que você, nem pode cheirar de longe, se quisesse.

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