domingo, 4 de outubro de 2015

DN/Lisboa faz hoje elogio à obra de José Vilhena

O cartoonista, pintor e editor de revistas como Gaiola Aberta e O Moralista fez da sátira a sua linguagem. José Vilhena morreu ontem, em Lisboa, com 88 anos
O deputado madeirense Luís Vilhena é sobrinho do Cartoonista José Vilhena

 Cartoonista, pintor, ilustrador, humorista, escritor. Qualquer meio lhe servia para fazer aquilo que ele fazia melhor: pôr a nu os podres e os ridículos da sociedade portuguesa. Herdeiro da tradição de Bordalo Pinheiro, a sátira era a linguagem principal de José Vilhena, o editor das revistas humorísticas Gaiola Aberta e O Moralista e que era conhecido pelos seus desenhos de mulheres voluptuosas.
José Vilhena fotografado em 1998 no seu ateliê. Foi processado várias vezes, por exemplo por Margarida Marante
Antes do 25 de Abril, mais do que em publicações periódicas preferia os livros, que não iam à censura prévia. Eram editados e só depois apreendidos – foi o que aconteceu a cerca de 40 títulos seus. Mas havia sempre alguns que eram vendidos por livreiros amigos, por baixo do balcão. “Eu era uma espécie de trapezista. A malta comprava os meus livros porque achava que no dia seguinte eu ia preso”, dizia. E chegou mesmo a ir preso, três vezes, e a ser chamado a depor por causas das suas publicações, embora nunca chegassem a acusá-lo: “Eles prendiam-me, eu andava lá dois ou três meses, depois punham-me cá fora ficava o assunto arrumado. Nunca cheguei a ser julgado em tribunal”, contou mais tarde.
Curiosamente, já em democracia continuou a ter outros problemas. A princesa Carolina do Mónaco chegou a pedir-lhe 80 mil contos de indemnização pelo modo como foi retratada. E também Catarina Furtado, Bárbara Guimarães e Margarida Marante, por exemplo, avançaram para tribunal por se sentirem ofendidas com umas fotomontagens suas.
José Vilhena nasceu a 7 de julho de 1927 em Figueira de Castelo Rodrigo, no distrito da Guarda. Desde cedo mostrou aptidão para o desenho. Frequentou Arquitetura na Faculdade de Belas-Artes mas não terminou o curso. Começou a colaborar com jornais e revistas, como o Diário de Lisboa e a Cara Alegre,e fez publicidade. Fundador da revista O Mundo Ri, em 1955, publicou em 1956 Este Mundo e o Outro, a sua primeira coletânea de cartoons, e em 1959 Manual de Etiqueta, livro de textos humorísticos. No início de 1960 começou uma série de livros de bolso humorísticos, que escrevia, ilustrava, editava e vendia por 50 escudos. São da altura pequenas pérolas como Branca de Neve e os 700 Anões ou História Universal da Pulhice Alheia.
Menos conhecida é a sua pintura “dulcemente erótica”, como lhe chamou Rui Zink que fez a tese de mestrado sobre Vilhena e o considerava “uma lenda viva”: “Quando não está a fazer sátira política e social, é desenhador, ilustrador e, soe bretudo, pintor” e era um homem “de alma grande em tudo: no carácter, no talento, na impertinência e... no seu amor ao corpo feminino”, escreveu num dos textos que lhe dedicou . Muitas vezes acusado de fazer um “humor ordinário”, Vilhena dizia que era “o humor possível no país impossível”.
A 15 de maio 1974, 21 dias depois da Revolução, saiu o primeiro número da revista quinzenal Gaiola Aberta. Aí, José Vilhena arremessava o seu humor corrosivo contra tudo e contra todos, fossem políticos ou padres, famosos ou não. A tiragem chegou aos 150 mil exemplares. Depois do tal problema com a princesa Carolina do Mónaco teve de interromper (por quatro anos) a publicação da Gaiola Aberta, tendo iniciado outras publicações, como O Fala Barato, O Cavaco e, mais recentemente, O Moralista. Trabalhou até 2006, quando os sintomas da doença de Alzheimer se intensificaram.




O velório de José Vilhena realiza-se a partir das 18.00 de hoje, na Basílica da Estrela, em Lisboa, estando o funeral previsto para as 11.00 de amanhã em direção ao cemitério do Alto de São João.



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