sábado, 26 de outubro de 2024

Francisco Teixeira da Mota tem infligido várias derrotas ao poder judicial fascista de Portugal no TEDH

 

Um segredo de justiça inteligente

  O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) já anda, há muitos anos, a lembrar às autoridades portuguesas que, tendo em conta o papel da liberdade de expressão que está consagrada na Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), não podem criminalizar jornalistas, acusando-os e condenando-os pela violação de segredo de justiça, por “dá cá aquela palha”. É certo que o Código Penal diz que “quem... ilegitimamente der conhecimento, no todo ou em parte, do teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça (…) é punido com pena de prisão até dois anos”, mas tal disposição não pode ter uma aplicação formal e automática, sem ter em conta “as circunstâncias particulares da publicação e do seu objecto, bem como o seu impacto na investigação”, só assim se respeitando a CEDH, que protege a discussão pública de questões respeitantes noticiados respeitavam a casos de enorme relevância social, não só pelas Æguras públicas envolvidas (do mundo da justiça e do desporto — futebol), como pela gravidade dos factos e natureza dos ilícitos em apreço (corrupção)”, e ainda que a publicação das notícias em causa não causara prejuízo para as investigações, nem para os próprios visados, absolveu os jornalistas por considerar que, no caso concreto, o segredo de justiça devia ceder face à liberdade de imprensa. O Ministério Público, que andara “assanhado” a vigiar os jornalistas e a perscrutar as suas contas bancárias, empenhado na missão de os ver condenados pelo crime de violação da segredo de justiça, não ficou satisfeito e recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), e aí a decisão foi no sentido contrário: os jornalistas passaram a criminosos. As razões foram várias: desde o facto de a lei não exigir a existência de prejuízos na investigação para considerar que o crime tinha existido, bastando a mera publicação das notícias, até à impossibilidade de se poder aÆrmar, “com qualquer mínima segurança jurídica”, que as notícias da revista Sábado não tinham causado qualquer prejuízo para as investigações. No STJ, para onde os jornalistas recorreram, os juízes-conselheiros Agostinho Torres, Vasques Osório e Luís Teixeira vieram esclarecer — devia ser de uma vez por todas, mas não vai ser — que a disposição do código penal que prevê e pune o crime de violação do segredo de justiça tem de ser inequivocamente interpretada de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, e não de uma forma literal e mecânica como os nossos tribunais costumam fazer. Embora admitindo que alguns dos factos divulgados pelas notícias estavam abrangidos pelo segredo de justiça, o STJ, atendendo à necessidade de exercício do direito à informação no contexto em que tinham sido divulgados os factos e as informações em causa, considerou que os mesmos não constituíram “uma violação punível” do segredo de justiça, dado que não se provara que aquela divulgação se mostrara “ostensivamente adequada a perturbar a investigação que estava a decorrer”. Inexistiam, assim, “sinais suficientemente decisivos (a chamada “necessidade social imperiosa”) da justiÆcação para uma ingerência da autoridade judiciária através da censura jurídico-penal assumida pelo Tribunal da Relação”, e o STJ revogou a condenação dos jornalistas, mandando-os em paz. Numa sociedade democrática, o direito à informação assim o determina. à justiça, nomeadamente o funcionamento da máquina judicial, as suas decisões e os seus protagonistas. A primeira vez que o TEDH condenou Portugal pela violação da liberdade de expressão/informação num caso de segredo de justiça foi no caso Campos Dâmaso c. Portugal, em 2008, mas depois dessa decisão já houve várias, tais como Laranjeira Marques da Silva c. Portugal, em 2010, e, muito recentemente Dias dos Santos Ferreira Costa Cabral c. Portugal, em Abril de 2024. O ensinamento é sempre o mesmo: a liberdade de expressão consagrada na CEDH só pode ser cerceada pelas autoridades quando exista “uma necessidade social imperiosa” e não pode resultar “dos maiores ou menores prejuízos causados à reputação de figuras públicas ou pessoas do poder ou de eventuais prejuízos a uma investigação criminal”. Mas, desta vez, no dia 17 do corrente mês, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) evitou mais uma condenação de Portugal em Estrasburgo, ao revogar, magistralmente, a condenação, por violação do segredo de justiça, dos jornalistas Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado da revista Sábado. Em causa estava a publicação de diversas notícias respeitantes aos processos denominados “dos emails”, Operação Lex e E-toupeira. O tribunal de primeira instância, considerando que “todos os factos noticiados respeitavam a casos de enorme relevância social, não só pelas figuras públicas envolvidas (do mundo da justiça e do desporto — futebol), como pela gravidade dos factos e natureza dos ilícitos em apreço (corrupção)”, e ainda que a publicação das notícias em causa não causara prejuízo para as investigações, nem para os próprios visados, absolveu os jornalistas por considerar que, no caso concreto, o segredo de justiça devia ceder face à liberdade de imprensa. O Ministério Público, que andara “assanhado” a vigiar os jornalistas e a perscrutar as suas contas bancárias, empenhado na missão de os ver condenados pelo crime de violação da segredo de justiça, não ficou satisfeito e recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), e aí a decisão foi no sentido contrário: os jornalistas passaram a criminosos. As razões foram várias: desde o facto de a lei não exigir a existência de prejuízos na investigação para considerar que o crime tinha existido, bastando a mera publicação das notícias, até à impossibilidade de se poder aÆrmar, “com qualquer mínima segurança jurídica”, que as notícias da revista Sábado não tinham causado qualquer prejuízo para as investigações. No STJ, para onde os jornalistas recorreram, os juízes-conselheiros Agostinho Torres, Vasques Osório e Luís Teixeira vieram esclarecer — devia ser de uma vez por todas, mas não vai ser — que a disposição do código penal que prevê e pune o crime de violação do segredo de justiça tem de ser inequivocamente interpretada de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, e não de uma forma literal e mecânica como os nossos tribunais costumam fazer. Embora admitindo que alguns dos factos divulgados pelas notícias estavam abrangidos pelo segredo de justiça, o STJ, atendendo à necessidade de exercício do direito à informação no contexto em que tinham sido divulgados os factos e as informações em causa, considerou que os mesmos não constituíram “uma violação punível” do segredo de justiça, dado que não se provara que aquela divulgação se mostrara “ostensivamente adequada a perturbar a investigação que estava a decorrer”. Inexistiam, assim, “sinais suficientemente decisivos (a chamada “necessidade social imperiosa”) da justificação para uma ingerência da autoridade judiciária através da censura jurídico-penal assumida pelo Tribunal da Relação”, e o STJ revogou a condenação dos jornalistas, mandando-os em paz. Numa sociedade democrática, o direito à informação assim o determina.


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