Escrever Direito Julian Assange com a vida em risco
A
decisão, da passada
segunda-feira, da juíza Vanessa
Baraister, de absolver Julian
Assange do pedido de
extradição apresentado pelos
EUA, não é, provavelmente,
mais do que um curto adiamento no
inexorável caminho do martírio do fundador
do WikiLeaks.
Inicialmente, Assange era suposto ser
extraditado para a Suécia ao abrigo de um
mandado de detenção europeu, mas evitou a
sua entrega, exilando-se na embaixada do
Equador em Londres em 19 de Junho de 2012,
onde permaneceu durante sete anos.
Entretanto, a Suécia desinteressou-se da sorte
de Assange e os EUA entraram em cena,
pretendendo a sua extradição, de início por
ter incitado o então militar norte-americano
Bradley Manning (actualmente Chelsea
Manning) a descodificar uma password para
tentar entrar numa rede de computadores do
Ministério da Defesa mas, posteriormente,
acusando-o pela prática de 18 crimes
susceptíveis de o fazer passar mais de 100 anos nas prisões norte-americanas. As
acusações consistem essencialmente em ter
conspirado para invadir computadores e
sistemas informáticos, obtendo, recebendo e
divulgando informações confidenciais
respeitantes à segurança nacional dos EUA. E,
sobretudo, os EUA acusam Assange de ter
revelado a identidade de colaboradores dos
EUA, no Iraque por exemplo, que
desapareceram e que não se sabe se foram,
ou não, até eventualmente liquidados pelos
taliban ou outras organizações terroristas em
virtude das revelações do WikiLeaks. Por
outro lado, como já referimos aqui, “as
centenas de milhares de documentos divulgados
pela WikiLeaks revelaram inúmeros factos
graves, ilegais e até criminosos das autoridades
norte-americanas, todos eles verdadeiros, todos
eles ocultados até aí. No YouTube, o vídeo do
criminoso ataque do helicóptero Apache já foi
visto por mais de 17 milhões de pessoas. E é este
levantar do opaco pano governamental, este
mostrar da verdade dos factos ocultada pelos
comunicados e declarações oficiais, que os EUA
não perdoam”.
Assange, na sua oposição à extradição,
levantou inúmeras questões técnicas e de
fundo, desde o decurso do tempo desde os
factos em causa à má-fé da investigação
conduzida pelos EUA, aos motivos de
perseguição política que estariam proibidos
pelo tratado de extradição existente entre os
EUA e o Reino Unido, bem como os direitos
consagrados na Convenção Europeia dos
Direitos Humanos, tais como a proibição da tortura e dos tratamentos desumanos e
degradantes, o direito a um processo
equitativo, o respeito pelo princípio da
legalidade ou, ainda, a liberdade de
expressão. Mas a verdade é que o tribunal
inglês afastou todas as considerações e
objecções jurídicas à extradição,
nomeadamente por considerar que as
mesmas não punham em causa os seus
fundamentos, podendo ser motivo de
discussão e de prova mas em sede de
julgamento já nos EUA...
A juíza Vanessa Baraister rejeitou, no
entanto, a extradição de Assange por motivos
exclusivamente humanitários e de saúde, por considerar, nomeadamente, face à prova
psiquiátrica produzida, que Assange, que é
uma pessoa deprimida, corria o sério risco
de, extraditado para os EUA, ser colocado
num programa administrativo especial com
uma série de medidas gravosas, entre as quais
uma restrição quase absoluta de qualquer
tipo de contactos com terceiros, mesmo
familiares ou advogados, que o conduziria,
muito provavelmente, ao suicídio. E, nos
termos da lei, o pedido de extradição deve ser
rejeitado se a mesma for “injusta ou opressiva”
tendo em conta a condição física ou mental
da pessoa em causa...
Assange terá respirado fundo com esta
decisão mas não descansou, até porque a
juíza lhe recusou a liberdade sob fiança,
mantendo-o detido enquanto aguarda o
resultado do recurso já anunciado pelo
Departamento de Justiça dos EUA, que
declarou num comunicado que, “embora
estejamos extremamente desapontados com a
decisão final do tribunal, estamos gratos que os
Estados Unidos tenham prevalecido em todos os
pontos legais levantados. Em particular, o
tribunal rejeitou todos os argumentos do Sr.
Assange sobre motivação política, ofensa
política, julgamento justo e liberdade de
expressão. O recurso vai certamente
centrar-se nas garantias de “bom tratamento”
de Julian Assange e vai ser, inevitavelmente,
uma batalha muito complicada para a sua
sobrevivência.
Fogo no lombo desse gajo
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