Renovadores alertam para declínio do PCP
Porque, em determinada altura, “estiveram envolvidos até ao sangue no PCP”, um grupo de antigos quadros e dirigentes comunistas lançou um abaixo-assinado apelando a uma mudança da estratégia do partido que evite o progressivo declínio político. “A não ser corrigida” a atual trajetória, o PCP “arrisca-se a um inexorável definhamento que desprotegeria a luta dos trabalhadores, enfraqueceria a aspiração pelo socialismo e abriria a porta ao avanço da direita”, lê-se no texto, assinado por mais de quatro dezenas de antigos quadros. Carlos Brito, Domingos Lopes, Paulo Fidalgo ou Cipriano Justo são alguns dos subscritores e agora organizados no movimento Renovação Comunista. “É um conjunto de pessoas que participou nas história do PCP e que está preocupado com o atual declínio eleitoral”, diz Domingos Lopes. “O PCP não tem rumo nem uma estratégia percetível e achamos que, a continuar assim, corre o risco de declinar e de se tornar irrelevante", acrescenta Paulo Fidalgo, presidente da Renovação Comunista. Domingos Lopes pertenceu ao PCP durante 40 anos, foi membro do comité central, dirigente e responsável pelo departamento internacional do partido. Paulo Fidalgo, foi dirigente da comissão de saúde do PCP e fundador do sindicato dos médicos da zona sul. Tal como Carlos Brito, alto-dirigente do PCP na clandestinidade e líder da bancada comunista no pós-25 de abril, nenhum dos antigos militantes é referido em nenhum dos documentos que assinalam o centenário do partido. E os renovadores não abdicam do seu papel. “Não era legítimo que as celebrações ficassem restritas à atual direção. O ideal comunista é partilhado por mais gente”, diz Paulo Fidalgo. “Nós estivemos lá, demos o nosso melhor, era impossível ficarmos calados”, diz Domingos Lopes. Os anos de militância partidária que deixaram para trás servem de justificação para o abaixo assinado: “É um imperativo ético, político e ideológico tomar posição face a este declínio do partido.” O antigo dirigente apela “à coragem de outros tempos” para que os comunistas “não arrisquem deixar o povo português sem o PCP”. “É preciso inquietar a base militante”, diz Paulo Fidalgo. Domingos Lopes acrescenta que “é necessário dizer: cuidado e coragem de dizer ‘não vão por aí, porque o atual caminho não vai dar a lado nenhum’. Se não houver essa coragem, a história não nos perdoará”, lê-se no manifesto. Na lista de subscritores do texto consta ainda Maria Augusta de Sousa, ex-bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Carlos Ramildes, que fez parte da comissão política do PCP ou Paulo Sucena, antigo dirigente da Fenprof. (Expresso)
Investigadores escrevem ao PCP a pedir acesso ao arquivo secreto Grupo inclui Pacheco Pereira e Arsénio Nunes, historiador comunista.
Em cinco anos de clandestinidade, o casal de artistas tornou-se especialista na falsificação de documentos para outros camaradas clandestinos. Por volta de 1960, José Dias Coelho e Margarida Tengarrinha receberam nova missão, tão secreta quanto as outras, mas fundamental para o futuro: a preservação em fotogramas, tipo microfilme, de um dos tesouros do partido — uma parte do arquivo da organização clandestina do PCP. Num pequeno estúdio fotográfico cumpriram a tarefa até José Dias Coelho ser assassinado a tiro pela PIDE, em dezembro de 1961. Hoje, sabe-se que um desses microfilmes, que esteve escondido até ao 25 de Abril, se deteriorou. Outro estará nos arquivos do PCP. Mas “nunca ninguém viu o que eles microfilmaram”, diz ao Expresso o historiador João Madeira. Ninguém fora do partido. O arquivo secreto do PCP, com notas de reuniões, relatórios da clandestinidade, parte do espólio desaparecido da PIDE e um manancial de objetos, é o ‘santo graal’ dos investigadores do comunismo português cujo partido está a comemorar os 100 anos desde o dia 6 de março. É tão secreto, guardado por uma casta de dirigentes históricos (como atualmente será Domingos Abrantes), que nem os especialistas arriscam certezas quanto à sua localização — estará na Quinta da Atalaia? — e são raros os que já lhe tiveram acesso alargado, mesmo os militantes académicos. Exatamente a propósito das comemorações do século do PCP, um grupo de cinco historiadores vai divulgar um abaixo-assinado, cujos termos foram combinados ao longo desta semana, a pedir ao partido para definir regras de consulta da documentação: a ideia surgiu num debate virtual promovido no sábado passado pela Fundação Mário Soares, moderado pela historiadora Fernanda Rolo, com a participação de José Pacheco Pereira Fernando Rosas, João Madeira e João Arsénio Nunes (que é militante do PCP). Contactado pelo Expresso, o PCP não comenta por ainda não ter conhecimento da carta. “O que lá está não se sabe, presume-se”, diz José Pacheco Pereira, que está a preparar o quinto volume da biografia de Álvaro Cunhal. “Na parte que estou a trabalhar, a dada altura refere-se que Octávio Pato mandou um relatório para Paris sobre os primeiros dias do 25 de Abril. Era importante conhecê-lo”, aponta o historiador. Mas este é só um exemplo. “Há várias zonas de incomodidade”, acrescenta Fernando Rosas, especialista em História do século XX. E aponta outros ângulos mortos: “Está pouco esclarecido o período da fundação do partido, em 1921, até à ‘reorganização’ em 1940/41, onde emerge Cunhal. Foram anos sob a influência do anarco-sindicalismo, com muita divergência interna.” Ou depois a fase de 1940 a 1945, “em que há dois jornais ‘Avante!’ e dois PCP”. O próprio João Arsénio Nunes, 72 anos, militante comunista e investigador no ISCTE — que se dedicou sobretudo a estudar essa fase antes da reorganização —, admite ao Expresso que só teve contacto direto com o arquivo em 1990/91, quando consultou documentos sobre a relação do PCP com a Internacional Comunista. “Eram cópias à mão, feitas pelo Carlos Aboim Inglez nos anos 70, quando tinha vivido na URSS”, uma coisa “relativamente magra”, comparado com a documentação a que nos anos seguintes havia de aceder no arquivo de Moscovo onde estão documentos do Komintern, a Internacional Comunista — os originais. Pela mesma altura, início dos anos 90, o historiador João Madeira pediu acesso aos arquivos do partido, para a sua tese de doutoramento, e queria consultar parte da coleção do jornal “O Militante” na clandestinidade. Fez o pedido. O partido disse-lhe que tinha de “indicar em concreto os assuntos em que estava a trabalhar, para que eles próprios escolhessem as edições”, mas o investigador estava a fazer uma análise mais extensiva e isso não lhe servia. Apesar de tudo, o PCP já foi mais fechado. Depois de ter começado a publicar a biografia de Cunhal, Pacheco Pereira também conseguiu os seus avanços. “Eu sei que ninguém teve a lata de pedir isto”, disse ao dirigente com quem falou. “De facto ninguém teve essa lata”, terá respondido o comunista. “E vieram pela primeira vez algumas coisas”, conta o fundador do arquivo Ephemera. Embora os outros quatro historiadores desejassem um acesso ao arquivo do PCP à imagem do que acontece com outros fundos (como no PC espanhol ou francês), Arsénio Nunes divide-se: “Como historiador, gostava de ter o máximo acesso. Como comunista, se tivesse responsabilidades políticas, punha restrições a zonas que correspondessem a atividades na clandestinidade e que envolvessem pessoas ainda vivas.” Resta saber como responderá o PCP. (expresso)
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